segunda-feira, 28 de outubro de 2013

ESTOU CONTENTE

Estou contente

Por saber que não vivo uma ficção ou utopia.
Por me sentir um cidadão fundamental,
aqui gerado e crescido de raiz.
Por poder gritar, em Portugal,
medrado em saudade e maresia:
– Tenho a Europa a meus pés e aqui à mão.
 – Sou pobrezinho mas senhor do meu nariz.

Estou contente

Por ver a transparência dos meus príncipes,
imbuídos de altruísmo e sentimentos,
reluzentes de franqueza e honestidade,
declarando os seus parcos rendimentos
como qualquer cidadão, vulgar mortal,
pedagogo, poeta e dramaturgo.
Por constatar que também sofrem de saudade
quando regressam, de vez, à capital,
cansados da fartura de Estrasburgo.

Estou contente

Por ver que prevalece a rectidão,
entre todas as normas de conduta,
e os braços da justiça são adagas
que não concedem amnistia nem perdão
aos vermes roedores, «bichos-da-fruta»,
que nos assolam a vida como pragas.

Estou contente

Por ver no meu país desconhecido,
rasgado pelos dinheiros estruturais,
estradas e pontes sem curvas e sem bossas.
Embora haja sempre alguém desiludido,
amante das paisagens naturais,
saudoso de ver burros e carroças.

Estou contente

Por poder abrir a boca, finalmente,
gritando em liberdade, com justiça:
– Tenho um rei e um ministro geniais.

Estou contente

Por ser súbdito deste reino diferente,
talhado em vinho fino e em cortiça,
predestinado a altos ideais.

Estou contente!

João Frada, Olhos nos Olhos da Alma, Edições CLINFONTUR

domingo, 27 de outubro de 2013

AGNOSIS

Ontem desfolhei-te,
apressado, entre o possível e o impossível.
Mas não te soube ler,
crente na minha lucidez,
na minha percepção inteligente,
na lógica provável, previsível.

Perspectivei-te
entre o legível e o ilegível,
como se as tuas ideias, todas,
desaguassem num estuário aberto e navegável.
E nada pude ver.
Nem águas, nem margens, nem foz
desse rio que inunda a tua mente.

Entrei em ti.
Mas não vislumbrei nenhum dos teus sentidos.
Não franqueei
a tua dor por dentro das palavras.
Não senti
a solidão nas tuas pálpebras cerradas.
Não pressenti
o teu mundo utópico, irreal.
Não percebi
a ironia dos teus versos delicados.
Não comunguei
do teu sofrimento transbordante.
Não avaliei
a força dos teus gritos sufocados.
Não distingui
nem suplício nem tortura.
Não vi teu desespero impaciente.
Hoje,
alienado e escravo da dor e da loucura,
pude compreender-te, finalmente.

João Frada, Olhos nos Olhos da Alma, Edições CLINFONTUR

O Conceito de Desestruturação Partido-familiar do Presidente da República

Não há razões para lançar a “bomba atómica”, dissolvendo o governo,… dizia há uns tempos Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, no decurso da entrevista em “Prós e Contras”. Talvez tenha razão. 
Há crise social e económica, mas não há crise política. Será que não? Mesmo dentro da coligação?!... esta, que transparece estar cada dia mais frágil, colada com cuspo, mal se aguentando de pé! Paulo Portas, porém, vai-se contentando com uns pirulitos que Passos Coelho lhe oferece, depois de bem regateados.   
Ainda que Paulo Portas, acrobático, inteligente e pragmático como é e sempre foi, a conselho ou não de Sua Excelência, o PR, continue a servir de boia de salvação ao seu parceiro Passos Coelho e a todos os náufragos deste navio tão desmantelado pelo vendaval da crise económica e social em que se tornou o país, a coligação dificilmente não soçobrará. Mas há quem afirme que é só uma questão de tempo e se não for por “bomba atómica”, acabará por ser pelo desgaste e pelos contínuos rombos no casco monetário. A ver vamos.
O PR, assumindo-se como o elemento agregador de todos os portugueses, como garante da estabilidade política do país, defende com a maior das convicções que jamais servirá de elemento “desestruturador” da sociedade a que preside. Desiludam-se os que esperam dele tal missão suicida. Compreendemos e respeitamos a sua postura. Mas apetece-nos dissecar o conceito de “desestruturador” a que se refere. Será que os milhares largos de famílias sem meios de subsistência, sem receitas de emprego para pagarem rendas, para darem comida aos filhos, para custearem minimamente a sua sobrevivência, em risco de despejo ou já despejadas da sua habitação, deprimidas e enlouquecidas pelo sofrimento, caídas ou a caírem na violência física e psicológica (onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão), no divórcio, outras até no crime, já que o roubo e a pilhagem têm aumentado em exponencial, o que é um fenómeno sociológico natural e previsível nestas circunstâncias, vivendo nas malhas da incoesão social e da desestruturação, não devam constituir preocupação para Sua Excelência, o senhor PR?! Ou a sua noção de desestruturação, da qual, frisou, nunca virá a ser o agente responsável, aplica-se apenas à família governamental chefiada por Passos Coelho, com quem se identifica politicamente?! 
Inexoravelmente sujeitos a esta alternância fatal que nos governa, se as eleições legislativas ocorressem nesta altura, antecipadas pela dita “bomba atómica”, seguramente, seria Seguro a governar-nos. Outro socialista. E Sua Excelência, o PR, não gostou do sentido de lealdade do último com quem teve de lidar, Sócrates. Apesar das constantes hesitações e da presidência errática de que o acusam, obviamente, considerações sem fundamento já que é um homem que “nunca se engana e raramente tem dúvidas”, na nossa opinião agiu bem. Preferiu apostar em Passos Coelho. Entre os dois, ambos incapazes de libertar o país da profunda crise financeira, económica e social em que se encontra, do mal o menos, escolheu o que melhor serve os interesses do seu clã político. Apesar de presidir a uma sociedade cada vez mais desestruturada, é melhor que a oposição se desiluda. O PR, cansado de ser constantemente alvejado por snipers políticos do PS, Sócrates, Mário Soares, Seguro, etc, pode ter ainda “raras dúvidas”, como ele próprio afirma, mas DESESTRUTURAÇÕES pela sua mão, dando a governação de bandeja aos socialistas, ISSO, NUNCA.   

João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 11.09.13

Um País de Desertos e Camelos

Num país de ficção, onde cerca de 10 milhões de camelos vagueiam em busca, não de oásis, que desapareceram há muito perto do mar, longe do mar, no norte, no sul, no centro, mas de catos, de arbustos rasteiros, de erva rala, restos que sobram da fartura de outros tempos, nessa jornada sem futuro nem meta de chegada, quantos vão ficando pelo caminho, trôpegos e desgastados pela marcha cada dia mais penosa, envelhecidos pela idade e sem fim à vista, uma verdadeira cáfila condenada à anomia e ao extermínio, porque os mais capazes e prolifícos vão rumando a outras paragens fora de portas, amarrando-se definitivamente a outros espaços e a outras rotas mais aliciantes, e os que por cá ficaram, pasto de feras esfomeadas que os rondam dia e noite, não têm tempo nem condições para renovar a espécie, nada que lhes garanta o mínimo de segurança, alimentação e saúde, nem para si nem para outros camelos, seus vindouros. 
Milhares de camelos, machos e fêmeas, instruíam, educavam e preparavam os mais novos para as longas jornadas dentro e fora dos desertos, mas os cameleiros, cada vez mais ausentes das suas funções, corrompidos pela usura e pela ganância, bem diferentes dos cameleiros de outros tempos, pouco se ralam em renovar a cáfila…e os pastos garantidos a quem já não tem dentes nem para ruminar e as múltiplas missões traçadas e ensinadas aos mais jovens estão destinados a perder-se, definitivamente, nos desertos da memória. No meio de tantos cameleiros, que de tanto lidar com camelos viraram, não camelos, pasme-se, mas burros no sentido popular do termo, ainda houve um “iluminado”, crente nos oásis, que ponderou premiar o nascimento de camelos,  mas ficou-se por aí. Não passou de uma efémera intenção. Os burros que se lhe seguiram preocupam-se com outros défices, não com a manada; essa, ainda que reduzida, serve os seus propósitos.
Um país sem horizontes,  com milhões de camelos envelhecidos, cansados de ser albardados, chicoteados, sangrados e vendidos, e sem camelos novos para troca de montadas, é uma pobre “caravana” condenada à extinção.  
    
João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 16.08.13

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

DEMISSÕES OU PUNIÇÕES?


“O Governo vai demitir os gestores ligados à contratualização de swaps especulativos nas empresas públicas, de acordo com a imprensa.
Serão afectados todos os administradores das seis entidades que o IGCP considerou terem subscrito produtos tóxicos. Estas são a Metro de Lisboa, Metro do Porto, Carris, STCP, CP e Egrep, responsáveis pela celebração destes contratos entre 2003 e 2011.”
(Governo demite gestores ligados a swaps especulativos  Economia ... dinheirodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=199868)

Analisando, simplesmente, o conteúdo desta notícia, poderíamos chegar a esta brilhante conclusão: o Governo, porventura convicto de que, junto da opinião pública recupera alguma credibilidade no plano da transparência, da isenção, do rigor e bom senso governativo, decidiu punir, através da demissão, meia dúzia de inteligentes figurões que, enquanto gestores da “coisa pública”, especialistas como serão ou deveriam ser em gestão, economia e finanças, não souberam avaliar os riscos dos contratos realizados  e acabaram por lesar o Estado, ou seja, todos nós, nuns bons milhões de euros. Obrigou-os a pedir a demissão, com vista a apurar factos até às últimas consequências, ou simplesmente aconselhou-os a irem pregar para outra freguesia, como é costume? 
Descem as taxas de juro, como poderiam ter subido, mas os inteligentes gestores das ditas entidades públicas, bem remunerados e quase sempre premiados a peso de ouro (alguns ganhando mais que o PM), em vez de preverem estas e outras oscilações, pelos vistos, optaram por negociar com a banca e fixar as taxas de juros. Uma decisão de somenos importância: as taxas de juro baixam,  mas em nada beneficiam o devedor, ou seja, a instituição que contraíu o empréstimo.  A banca continua a engordar e o erário público a emagrecer. Mais uns negócios ruinosos e danosos para os cofres do Estado, isto é, para os bolsos esburacados e vazios de todos nós. Um azar, uma imprevisibilidade, um pormenor que não deve ser tomado tão à letra pelo tão zeloso Governo. E vai daí, punem-se os ditos cujos, obrigando-os ou, porventura, aconselhando-os a assinar um vergonhoso pedido de demissão. 
Passos Coelho parece mesmo decidido a tomar a peito a investigação destes ruinosos contratos, tão lesivos das nossas frágeis finanças públicas:
“Houve muitas empresas que deram pareceres, muitos assessores financeiros que deram pareceres, aval a essas situações, que disseram: essas decisões foram muito bem tomadas, é preciso saber quem é que nessas empresas deu esses pareceres positivos, achou bem aquilo que hoje custa milhares de milhões de euros de custo potencial para o país (…)
O PM defende ainda que “enquanto essa gente estiver a fazer pereceres e a assinar contas, essas empresas não sejam contratáveis pelos institutos públicos, pelas empresas públicas, pelo Estado”.( Responsáveis pelos 'swap' devem ser afastados - Política - Sol sol.sapo.pt/inicio/Politica/Interior.aspx?content_id...)

Muitos por aí pedem que o PM não pretenda apenas saber quem foram ou são todos os intervenientes e maus decisores neste processo, direta ou indiretamente responsáveis por mais este descalabro nas contas públicas, e peça responsabilidade criminal por gestão danosa, e já, a todos eles. Se PM perdesse a cabeça e ousasse ir por diante com tal ousadia, provavelmente, desta vez, é que iria ser a dita “bomba atómica”, pior que o relatório do FMI sobre os cortes de Estado apresentado em janeiro passado. Isso não! Seria um exagero…realmente nunca visto em Portugal. Com gestores de nível, gente de gravata e colarinho branco, com currículos irrepreensíveis, tem de haver alguma complacência. Ainda se fosse um cidadão qualquer, metido a empresário, que geriu mal o negócio e no fim do ano não pagou a quem devia, não pagou à Segurança Social, nem pagou o fisco! Esse, sim, porque é burro, uma besta sem estudos e se mete a gestor sem perceber bem o que são swaps, assumindo às cegas contratos bancários com taxas de juro fixas, e arruinando completamente o património da empresa, tem que ser punido: arrestem-se-lhe os bens, congelem-se-lhe as contas bancárias, prenda-se o indivíduo, apliquem-se-lhe penas cívicas na impossibilidade de compensações pecuniárias, dê-se-lhe um castigo exemplar. Agora a gestores desta categoria, que se desgasta(ra)m a administrar entidades complexas como aquelas supracitadas, às vezes sabe-se lá com que sacrifícios, já que são conselheiros, dão pareceres e administram, simultaneamente, bem mais de uma dúzia de empresas com toda a sapiência e elevado grau de dificuldade, cumprindo horários de trabalho de “28 horas por dia”,  seria uma indignidade, uma injustiça! E correr-se-ia o risco de qualquer dia ninguém querer aceitar estes incómodos lugares na administração pública, o que poderia constituir um percalço governativo considerável, não obstante as chorudas remunerações auferidas. É de realçar que estes superiores cargos de gestão são quase sempre, como é óbvio, atribuídos a gente “espertíssima” na matéria… governadores, diretores e administradores…que, demonstradamente, nestes últimos 25 anos, por total iniciativa individual ou fiados nos seus mais diletos conselheiros, experts na mesma área, tem conduzido sabiamente os rumos do país e contribuído pelo seu esforço abnegado e patriótico para o enriquecimento, bem-estar e felicidade de todos os portugueses. Colocados nos mais diversos setores estratégicos, ministérios, banca, etc., a sua altíssima competência, nacional e internacionalmente reconhecida, é de tal ordem que a maior parte deles acaba por ir parar a bons lugares, fora de portas, como o Banco Central Europeu, por exemplo, instituição onde parecem ir parar todos os nossos distintos “vítores”, muito justamente agraciados pelas “vitórias” alcançadas dentro de portas. Se Portugal é, em termos económico-financeiros e sociais, a expressão incontestável da sua […deles…] brilhante capacidade governativa é justo que o BCE possa usufruir também dos seus insubstituíveis e profícuos contributos.  Por todas as razões, obriguem-se os maus gestores a pedir a demissão, mas puni-los com responsabilidade criminal, isso, não! Abrir um precedente desta natureza poderia constituir uma epidemia jurídico-penal difícil de controlar. Se a justiça é uma via com tráfego de velocidade lenta passaria, seguramente, a ficar entupida, de vez.

João Frada
Professor Universitário     
Lisboa, 01.06.13

domingo, 20 de outubro de 2013

O SUS do Brasil e os Médicos Importados

Na sequência do que temos ouvido e lido sobre o interesse do SUS (Sistema Único de Saúde) e a enorme importância sanitária e assistencial deste serviço público, tendo a conta a realidade assistencial e sociológico-política do Brasil e a ação de sistemas de saúde idênticos implementados noutros países, somos levados a concluir que se trata de uma grande conquista política, não obstante as falhas e imperfeições que lhe possam ainda atribuir.  
O facto de toda a gente, pobre, remediada ou rica, a partir de 1988, ter acesso a serviços de saúde poderá, futuramente, vir a representar um dos maiores ganhos de política social do Brasil, desde que se observem os necessários e constantes ajustamentos à realidade global do país. Segundo fontes sobre o assunto, o número de beneficiados passou de 30 milhões para 190 milhões. Por outro lado, o ter deixado de ser da responsabilidade do Poder Executivo Federal a gestão deste sistema, para passar a ficar sob a tutela dos diversos Estados e municípios, na verdade, instituições bem mais próximas e identificadas com a população e com os seus problemas sanitários, é também uma nota positiva.
A estrutura do SUS, assente no SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e noutras políticas nacionais de saúde extensivas e dirigidas a setores específicas da população, contemplando a Mulher, o Trabalhador, o Idoso e a Criança, através de programas alargados de vacinação, em termos globais tem tido um papel decisivo na mudança da saúde pública brasileira.
Em termos teóricos, o SUS é um projeto bem pensado, mas quando se passa à prática, quando os gestores e administradores nem sempre velam pela boa execução e aplicação das diversas ações e estratégias que este sistema implica e para as quais foi criado - garantir a tal equidade e universalidade de acesso a técnicos e técnicas diferenciados, quer no âmbito do diagnóstico quer no domínio terapêutico, possibilitar as condições mínimas em todos os pontos do Brasil para que o SUS possa funcionar (e a eletricidade é fundamental), em concordância com a universalidade que apregoa, alargando e disponibilizando a todos os cidadãos brasileiros os mesmos recursos médico-assistenciais, residam eles nas cidades ou nas zonas rurais, enquanto tal não acontecer o SUS é, no mínimo, um sistema claudicante. Mas se nas áreas mais recônditas do Brasil, o SUS tem e vai continuar a ter grandes dificuldades de aplicação com êxito, face às inúmeras carências básicas desses locais, em municípios localizados em Estados considerados de elevado grau de desenvolvimento, como é o caso de Santa Maria, a 5ª cidade mais populosa do Rio Grande do Sul, as falhas do Sistema Único de Saúde não deixam margem para dúvidas. E, pelos vistos, não é por falta de estruturas sanitárias altamente equipadas ou de técnicos especializados em número suficiente, porque só estabelecimentos de saúde contam-se 127, estabelecimentos de apoio a diagnóstico e terapias são 84 e postos de saúde são 23. Apesar disso, nos últimos seis meses o número de queixas e protestos, muitos deles apresentados junto de entidades judiciárias, contam-se às centenas. As causas são inúmeras: atrasos de atendimento em consultas especializadas, grande morosidade a nível de estudos de diagnóstico imagiológico (ecografias, tomografias e ressonâncias), não acesso a medicamentos que constam como integrados na lista fornecida pelo próprio SUS, inacessibilidade a fórmulas e produtos dietéticos especiais destinados a crianças e adultos (com patologias de caráter alérgico ou intolerante), não previstos pela mesma lista, atraso considerável de tratamentos cirúrgicos e quimioterápicos… 
A estrutura e a definição precisa, no papel e nas leis, do que deverá ser o SUS na sua ação global por todo o larguíssimo espaço brasileiro, tanto quanto sabemos, não nos oferece dúvidas. Nas cidades, com algumas ressalvas, como vimos mais acima, estas respostas assistenciais parecem corresponder às expectativas dos utentes: recursos farmacológicos, humanos e tecnológicos no âmbito do diagnóstico e da terapêutica diferenciados e em grande número. Mas, e no interior tão vasto do país?! Será que a população pode contar com a eficácia e prontidão de todos os recursos do SUS?
Portugal, no seguimento das grandes mudanças políticas geradas pela Revolução de Abril de 1974, pôde contar com um vasto sistema médico-assistencial a nível de cuidados de saúde pública e hospitalar, cobrindo todo o território nacional. A presença obrigatória dos médicos portugueses recém-formados junto das populações mais ou menos isoladas do país, pautou-se, durante várias décadas, por um saldo bastante positivo em relação a cuidados de saúde primária, a campanhas vacinação e saúde escolar, e ações de sensibilização e informação centradas sobre os mais diversos problemas sanitários, desde doenças endémicas, alimentação, controlo de diabetes e hipertensão, etc., mas as condições de prática clínica e os recursos de diagnóstico e farmacológicos disponíveis, como seria óbvio, nos locais mais periféricos e isolados, mesmo com toda a boa vontade dos clínicos, nunca poderiam comparar-se aquelas que as grandes ou mesmo pequenas urbes podiam e podem oferecer. 
Será que no Brasil imenso, desde a Amazónia ao Rio Grande do Sul, o SUS consegue oferecer e prestar a todos os seus utentes iguais acessos e oportunidades aos recursos médico-assistenciais disponíveis? Mais vale ter um médico à mão do que não ter nenhum, dirão muitos. Mais vale ter um posto de saúde com poucas condições do que não ter nenhumas, dirão outros. Mas, ainda que haja postos de saúde ou hospitais montados no interior do país, a cargo dos respetivos municípios, cujos níveis de resposta possam ser satisfatórios, estará a grande maioria da classe médica interessada em prescindir das suas comodidades de vida na grande cidade, para se deslocar para o sertão ou para qualquer outra região recôndita e mais ou menos inóspita do Brasil? Estará o Governo brasileiro disposto a aliciar os seus clínicos e demais especialistas de saúde, não só médicos, mas também enfermeiros, técnicos e “atendentes”, com melhores condições salariais e já agora, que estamos numa de “bolsas” (a bolsa-copa foi a última), oferecendo “bolsas de interiorização”, por forma a garantir uma boa rotação de serviço obrigatório à periferia ou no interior, como aconteceu durante muito tempo em Portugal?  
Confrontamo-nos, porém, como outra questão, que nos parece não de menor importância: o número de médicos brasileiros formados pela universidade federal (ou seja, aqueles que fizeram a sua aprendizagem à custa de dinheiros públicos), será em número suficiente para assegurar em todo o espaço brasileiro as necessidades de saúde da população ou é mesmo fundamental contratar profissionais de saúde no exterior, em Portugal, em Espanha e, particularmente, em Cuba?  
Há quem discorde desta medida. E porquê? Porque teme que as populações, ainda em grande parte analfabetas, nomeadamente aquelas que residem no vastíssimo espaço amazónico, no Nordeste e em algumas regiões mais ocidentais e interiores do Brasil, pela sua humildade e simplicidade, possam ser mais facilmente catequizáveis pela filosofia política de marca marxista-leninista veiculada pelos cerca de seis mil médicos cubanos importados durante a presidência de Dilma Rousseff, na sequência dos recentes acordos estabelecidos com Cuba. Sobre esta pretensa invasão considerada por alguns analistas como perigosa, não venham os ditos médicos, todos eles “potenciais espiões comunistas”, a difundir e a imprimir com sucesso as suas ideias maquiavélicas em vez de se limitarem apenas ao exercício da “nobre arte”, diremos que o “comunismo” supostamente pregado pelos milhares de médicos cubanos não pegou em Angola nem pegou em Moçambique, onde exerce(ra)m medicina durante décadas, preenchendo os quadros orgânicos da saúde destes países cujas taxas de analfabetismo eram e são incomparavelmente maiores. As diferenças socioeconómicas entre os diversos estratos sociais são tremendas, mas os ventos da economia liberal ou neoliberal é que vão marcando os rumos da política. O comunismo, nem nos países que sempre foram o baluarte da sua génese e arquitetura subsiste. É ideologia que, nas poucas bolsas que o albergam, tende a embolorar, a volatilizar-se pela enorme e rápida pressão da sociedade global e comunicacional a que assistimos. Cremos, é, que os médicos cubanos, a quem são reconhecidas incontestáveis qualidades de formação profissional, habituados a viverem com racionamento de tudo, se sentirão bem mais felizes e realizados no Brasil do que na sua pátria. E se há alguém que corre o risco de sofrer uma rápida aculturação são os médicos cubanos e não os beneficiários do SUS. Estes, apenas correm o risco de terem médico, autóctone ou importado, mas não terem recursos auxiliares de diagnóstico, farmacológicos e terapêuticos suficientes. Compete ao Governo brasileiro, isso sim, disponibilizar os recursos humanos e tecnológicos suficientes para que todo aquele que queira e possa vir a exercer medicina nos locais mais isolados do país possibilite às populações, sob os seus cuidados, o melhor apoio médico-assistencial e com a maior dignidade possível.  
O SUS, projetado como um grande “motor” da saúde pública brasileira, precisa ainda de muita afinação.           

João Frada
Médico/Professor Universitário
Lisboa, 02.07.13

sábado, 19 de outubro de 2013

Confusões Semânticas

Miguel Sousa Tavares, seguramente, cauteloso e ciente de que as suas afirmações lhe poderiam trazer algumas inconveniências, sendo ele quem é e assumindo que Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, não lhe merece, nem tem merecido, nem virá sequer a merecer consideração alguma,... e ele lá terá as suas razões, de resto, idênticas ou não, às de outros milhões de portugueses que não se manifestam acerca do perfil da nossa mais alta eminente figura institucional nem são tão visíveis como o Miguel S. Tavares, embora a muitos, estamos certos, não lhes falte igual vontade de clamarem o que lhes vai na alma…, fez o que pensou ser mais adequado: retratou-se. Afinal, esta consideração metafórica dita na hora e no local errados, diz-nos Miguel Sousa Tavares, foi mais um “deslize” instintivamente pronunciado porque o senhor Professor Doutor Cavaco Silva não faz realmente o seu género de figura política. Sousa Tavares, como qualquer ser humano, tem todo o direito de escolher os seus ídolos, de fazer as suas opções e o Professor Cavaco Silva, pelos vistos, não preenche os seus requisitos exigentes de “excelso animal político”. Éramos capazes de apostar que, para o Miguel S. Tavares, teria de ser um animal racional, inteligente, culto, certamente mais sisudo, dotado de uma boa armadura retórico-dialética de índole positivista, pragmática e laica, entre outras qualidades. A verdade é que o senhor Presidente, contrariamente ao  Miguel S. Tavares, não é um literato no sentido real do termo, um intelectual, como o Miguel desejaria que fosse,    acredita piamente na N. Sra. de Fátima e na sua divina intercessão para nos tirar da crise, é um homem de discurso simples e ecuménico, como convém a um presidente, de bom caráter, bem disposto, dá um pezinho de dança quando o convidam durante uma ou outra inauguração nas suas frequentes digressões regionais, diz umas piadas animadoras, queixa-se das mesmas amarguras que flagelam o povo (referindo que o baixíssimo fundo de pensões do banco de Portugal e da Caixa Geral de Aposentações, que se supõe rondar apenas os 12.000 euros por mês, mal cobre as suas despesas), a ver se a malta mais desmilinguida pela austeridade, pelas crescentes dificuldades e pelo desemprego, não o apupa nem vaia demais, vai semeando esperança, fazendo de conta que tudo está mais ou menos bem, que o país caminha a passos lentos mas firmes para a recuperação, que estamos, não tarda, quase livres da malfadada TROIKA, convocando o Conselho de Estado para discutir o que, está à vista de toda a gente, a eminente saída desta “gente troikiana” (como diz o Paulo Portas) e a urgente e atempada definição estratégica do pós-troika para, enfim, podermos assistir a uma entrada triunfal do país em algo que se aproxime a um Oásis, parecido com aquele de que falava o ex-PM. Lembram-se?! Apenas fica um pouco mais tenso e reativo quando os chatos da comunicação social exageram ou o Alberto João Jardim o trata por senhor Silva. É um homem esperançoso, que pretende com a sua ação presidencial transmitir alegria, boa disposição e esperança no futuro a todos os portugueses. É visível todos os dias o seu esforço. Miguel Sousa Tavares, se atentasse bem, inteligente e culto como é, perceberia de imediato que escolheu mal o adjetivo, se a intenção era desprestigiar o PR, porque ser “palhaço” não é uma indignidade. Pelo contrário, o verdadeiro palhaço é uma figura grata capaz de transmitir ou até imitar na perfeição tudo aquilo que um Político, na concepção de muita gente, pode representar, uma série de facetas, incluindo a esperança, a fé e a utopia. E sem estas, o mundo não avança. Dito isto, e não pretendendo ser advogado de ninguém, porque para tal não temos nem formação nem procuração, mas colocando-nos mais na posição de psicoanalista, somos levados a crer que o adjetivo de “palhaço”, neste caso particular, referido por Miguel S. Tavares, deveria era ser encarado com uma distinção e não como um insulto, ainda que não fosse essa a intenção de Miguel S. Tavares…como ele assumiu. Porque afinal, à passagem e presença do PR em diversos locais e ocasiões, dada a situação tão emotiva que o país vive, já ouvimos, vimos e lemos na comunicação social televisiva e não televisiva considerações e adjetivos bem mais incómodos e, porventura, mais insultuosos. O conceito de palhaço, tantas vezes usado com sentido pejorativo, lamentavelmente, acaba por conduzir a estes exageros de interpretação e eis que o próprio PR se sentiu atingido na sua dignidade pessoal. E apresentou queixa ao MP, o mesmo que parece ter tido “ouvidos moucos”, como afirma José Sócrates, em relação a idênticas situações ocorridas anteriormente, visando outras figuras de Estado. Ao MP caberá pronunciar-se sobre este opróbio. Mas Sua Excelência, o senhor PR saberá, melhor do que ninguém, quem é e quem não é. E muitos já perguntam: será que não está a dar demasiada importância a quem não deve e ao que não deve? Lembremo-nos, por exemplo, dos simpáticos palhaços que espalham alegria, boa disposição, diversão, comicidade, ânimo e esperança, não apenas no circo, mas nas enfermarias dos hospitais, a quem sobrevive à doença, a quem está profundamente debilitado, fragilizado e deprimido…e precisa de sorrir e acreditar que há futuro. Ora, atente-se nas semelhanças e digam lá se deve ser considerado insulto! Achamos que tudo não passou de um comentário impremeditado, de uma verdadeira confusão semântica, e o Miguel S. Tavares, arguto como é, apenas não conseguiu, desta vez, analisar esta tão simples questão. Apelando ao espírito magnânimo e ao sentido de humor de Sua Excelência o PR, apetece-nos gritar bem alto: vivam os palhaços e as palhaçadas se forem para nos fazerem mais felizes. Os portugueses precisam de sorrir. Não dimensionemos o que não tem dimensão.    

João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 27.05.13 (comentário atualizado)


OS NOSSOS CAUDILHOS

Ouvimos há dois dias na TV Constança Cunha e Sá, de língua afiada, mas bem orientada e acutilante, cortar a torto e a direito, ao centro e à direita, e um pouco mais moderadamente à esquerda, contudo, com a mesma precisão cirúrgica. Gostámos de a ouvir. Não poupa adjetivos a quem quer que seja. 
Falou sobre o PM e sobre todos os seus admiráveis companheiros, gente de discurso elegante que vai papagueando com grande convicção o que o seu mestre ordena, apregoando o êxito de uma governação que, tendo recebido uma herança socialista pesada, mudou o rumo da navegação e acredita, finalmente, ter produzido aqui, neste jardim à beira mar plantado, o oásis em que Sócrates acreditava. Acrobaticamente, com um desgaste físico e mental tremendo, fazendo horas extraordinárias, aos sábados, domingos, feriados e dias santos…já em menor número…o nosso esforçado PM, nunca tendo trabalhado tanto na vida, nem enquanto prestava serviços dedicados aos seus grandes amigos Ângelo Correia e “Dr. Relvas” (absorvido também aqui na sua admirável campanha de formação aeroportuária garantida pela Tecnoforma), conseguiu o impossível: paradoxalmente, baixou a receita fiscal, apesar do agravamento tributário, baixou o desemprego, nomeadamente o dos boys ligados ao PSD, baixou as dívidas de centenas de amigalhaços a quem garantiu excelentes empregos, bem remunerados e compensados ainda com uns cartões de crédito para compras, viagens e refeições, sobretudo daqueles que, apesar de poderem gastar à tripa forra e terem ainda direito a subvenções ou subsídios de férias e de Natal, conseguem fazer umas boas poupanças com esta “sorte grande” que lhes saiu, conseguiu harmonizar os vencimentos entre o público e o privado, mesmo sabendo que o público lhe assegurou, por imposição obrigatória, duas bolsas gigantescas do Fundo de Pensões da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, hoje quase esgotadas pelas distrações dos sucessivos governos, incluindo o seu, minimizou os gastos com a saúde, poupando milhões de euros, claro está, não comparticipando a maior parte dos medicamentos e aumentando brutalmente as taxas moderadoras, contribuiu, com grande esmero, tal como os anteriores governos, diga-se de passagem, para a redução drástica de gastos com a educação, pondo milhares de professores na rua e alienando dezenas de escolas, já que, sem meninos, estavam às moscas. Mas fez mais: chutando para a emigração milhares largos de jovens, gente em idade de poder fazer meninos, e não apoiando nem alimentação, nem artigos de higiene, nem vacinas, nem vitaminas, nem a maior dos fármacos prescritos pela Pediatria à cachopada que ainda vai nascendo por aqui e por acolá e, a par dos pais desempregados e sem casa, vive em casa dos avós, estes, coitados, a braços com duras dificuldades pela redução dos “elevados” ordenados e pensões que, ele, o PM insiste em arrasar em 2014 um pouco mais para poder garantir emprego aos seus fiéis boys, muitos deles super-especialistas nas mais diversas áreas académicas e científicas, rapazes e raparigas entre os 23 e os 30 anos, por todas estas intervenções governativas excecionalmente brilhantes, direi mesmo inteligentes, o nosso ilustre PM e todo o seu séquito têm contribuído com grande sabedoria para o controlo demográfico e, visivelmente, para o equilíbrio das finanças públicas. O exemplo mais acabado é mesmo este, o da demografia: menos acesso a cuidados de saúde e a farmácias, morre-se mais e dura-se menos, menor natalidade, menos gente a mamar subsídios, menos hospitais, menos escolas, logo, menos encargos com a assistência médica, com docentes e com educação, na verdade, os dois grandes algozes das finanças de qualquer governo. Tem sido uma ginástica notável, esta governação, lamentavelmente, pouco solucionadora das dificuldades sentidas pela grande maioria dos portugueses e cada vez mais errática e gravosa…, como diz a Constança Cunha e Sá. Se houvesse Olimpíadas de Governos Incapazes, seríamos seguramente sérios candidatos ao primeiro lugar!
Constança Cunha e Sá analisou também, sem grandes rodeios, o papel do PR: uma espantosa figura, dizia ela, que chefia fielmente e com coerência partidária o clã governamental, ou não seja ele também um venerável membro do partido. Mas surgem mais sinais de descontentamento da cidadania. Mário Soares acusa-o, tal como Constança Cunha e Sá, de desonestidade ou incoerência política, pela sua incapacidade de assumir a ligação privilegiada ao BPN. Estranhamente, Cavaco Silva assume-se como um simples depositante do BPN e não como um convidado privilegiado que foi, já que o acesso àquela instituição bancária não era para toda a gente e muito menos a compra de ações. Depois, a diferença entre o preço de compra e de venda foi de tal ordem que o banco, com negócios destes, perdendo um valor astronómico na transação, só mesmo por especial razão poderia ter efetuado este negócio. E qual seria?! Toda a gente gostaria de saber. Até nós.
Estranha compra (oferta?) de ações BPN à SLN e a Oliveira Costa (BPN), diz Soares, insistindo que Cavaco Silva venha a público explicar, de uma vez por todas, o inexplicável. E a única resposta de Cavaco Silva que se ouve e nada esclarece sobre a questão é esta: “ainda está para nascer quem seja mais honesto que eu”. Aguardemos, então, por esse utópico nascimento tão dotado e genial, não obstante a quebra de natalidade que se aponta, fragilizada por tantas dificuldades económicas e precaridade alimentar, e esperemos por um cruzamento de gâmetas tão privilegiado como o que terá ocorrido, in illo tempore, lá para os lados do Algarve!
Miguel Sousa Tavares batizou, quanto a nós, erradamente, o PR de palhaço e teve de se retratar. Esta grata figura de circo, palhaço, considerando o conceito integrado num espaço de entretenimento e não na arena política, de um modo geral, reúne uma enorme diversidade de atributos, patentes nas piruetas, nas cambalhotas, nas falsas magias que divertem a quem o vê, nas cançonetas que interpreta afinando ou desafinando, nas improvisadas macacadas cheias de graça e boa disposição, nas capacidades acrobáticas que tantas vezes lhe são peculiares. Claramente, Miguel Sousa Tavares não escolheu bem o dito adjetivo. Cavaco Silva não se identifica minimamente com esta figura, nem nas graçolas nem nas acrobacias. É um homem sério e de riso não fácil, de certo modo, até comedido. E, neste caso, do BPN e das ações a que Mário Soares, Constança e outros tantos analistas se referem, por mais “flexibilidade esquelética” que os seus argumentos possam ter, por mais contorcionismo que as suas razões possam intentar, vai ter uma enorme dificuldade em “descalçar a bota”.

João Frada
Professor Universitário

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Discorrências sobre as parcerias estratégicas luso-angolanas

“O Presidente angolano, [José Eduardo dos Santos], pediu à UNESCO que acompanhe o combate à pobreza, porque em Angola muitas pessoas ainda vivem mal” (Correio da Manhã, 9 de Abril de 2012). [Esta notícia foi matéria de um artigo que publicámos com o título “Discorrências” no jornal O Caravela, edição da Comunidade Luso-Brasileira do RGS-Porto Alegre-Brasil]
Hoje, em 15 de outubro de 2013, Sua Excelência, o PR de Angola, cortou, de vez, a parceria estratégica estabelecida com Portugal. Cremos que não ficará por aí, esta perrice decorrente da saga Rui Machete-Procuradoria Geral da República Portuguesa. Mais umas vingançazinhas poderão vir aí. 
Percebe-se que acabou, definitivamente, a paciência para aturar os idiotas dos “portugas” que passam a vida a levantar falsos testemunhos sobre infundadas somas de capitais que ele, a família e os mais bem-aventurados do clã, farão escorrer para a Europa e, em particular, para bancos portugueses, alguns, que apenas por acaso ou sorte, lhes vieram parar às mãos, somas essas consideradas como “branqueamentos ilícitos”. Boatos, falsidades, iniquidades, invejas ou dores de corno, como diz o povo, que é sábio, apenas para denegrir quem tem sérias preocupações com a governação e com os dramas da pobreza sentidos pelo povo angolano, como dá para ver naquele sentido pedido formulado junto da UNESCO, em abril de 2012. Um problema sério como a pobreza, a que se juntarão, como é óbvio, a miséria e a fome, não pode ser combatido em meia dúzia de meses. O trabalho de luta contra a pobreza prossegue no terreno. O empenhamento da governação angolana é um assunto sério e, como tal, há lá tempo e disposição para branquear o que quer que seja!? Só gente invejosa ousa inventar tretas e denegrir a imagem de indivíduos que não veem mais nada senão a reabilitação da pobreza no país, respondendo ao lancinante apelo do seu presidente, junto daquele organismo das Nações Unidas. 
Como é que alguém sabendo do tremendo envolvimento anímico, político e monetário do Estado angolano nesta estratégia de reabilitação social, em que todos os recursos, gente e capitais, fazem falta dentro de portas, porque está em causa a nação e, sobretudo, as “muitas pessoas que ainda vivem mal”, tem a lata de levantar calúnias como as que se ouviram em torno de gente da maior confiança do governo? Só alguns excedentes é que foram aplicados fora do país e tudo sob absoluta transparência e clareza financeira. Quem disser o contrário mente, divaga, delira, e é exatamente o que se tem passado com esta história da suspeição em torno de ilustres figuras do governo angolano. Os refinados ladrões e corruptos que, como “ouro de lei”, pululam, isso sim, dentro da administração política e judicial portuguesa, é que lançam atoardas e veem o crime, a maldade e segundas intenções em gestos e atos onde eles não existem. Estamos para ver o que irá sair da PGR. Depois, não se queixem que o défice aumenta com a quebra das exportações ou com um bom pontapé bem assestado na “bunda” dos milhares largos de “portugas” que por lá ganham a vida e, convictamente, enviam para cá gordas remessas, pelo menos, enquanto o vírus de Chipre não se estender para o mediterrâneo ocidental e, em especial, para a Península Ibérica. À fome de dinheiro que por aí anda, já faltou mais.      
Olhando para Angola, há que ter em conta o pesado fardo que é governar num país acabado de sair de uma guerra civil de 30 anos a somar a uma outra anterior de 25. Por isso, não façamos mais guerrinhas, senão corremos o risco de ninguém mais nos querer comprar os poucos haveres que ainda sobram do nosso património, fundamentais a evitar outro resgate. Enquanto houver investimentos oriundos de Angola, estamos garantidos. Não os enxotem daqui.
Ponhamos uma pedra em cima do caso Machete-PGR e deixemos os angolanos em paz. Se querem investir e têm com quê, pois sejam bem-vindos. Afinal de contas, porque é que, com tantos paraísos fiscais à nossa volta, tolerados e usados por toda a gente… até o Banco de Portugal terá fechado os olhos à colocação dos Fundos da Segurança Social, 42 milhões de euros, facto conhecido por Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças, e nunca desvendou quem foi o responsável por esta negociata…, não podemos também abrir aqui neste jardim à beira mar plantado um convidativo offshore, competindo com a Suíça, com a Madeira, com Gibraltar, com Mónaco ou com as Caimão, dando hipótese a angolanos, a chineses, a indianos e a brasileiros de colocarem cá os seus baús, malas e containers cheios de “papel”?! 
Os estraga-prazeres da PGR ainda não perceberam que essa seria a melhor maneira de pagar a dívida num ápice e de deixarmos de ser, de uma vez por todas, o eterno protetorado da troika e o refém das diversas entidades financeiras internacionais.
Mais vale cortarmos com as imposições da União Económica e Monetária, que só nos têm trazido austeridade, desemprego, miséria e fome e, por mais carga fiscal e manobras que se inventem, não chegam para reduzir nem dívida, nem défice. Deveríamos, isso sim, ponderar em abrir de vez as portas ao investimento estrangeiro em regime de offshore. Não vamos lá com políticas de bom comportamento ditadas pela Alemanha, pela troika ou pelos sábios ao serviço do FMI ou dos interesses da Alta Finança Internacional.   

João Frada
Professor Universitário

DISCORRÊNCIAS

“O Presidente angolano, [José Eduardo dos Santos], pediu à UNESCO que acompanhe o combate à pobreza, porque em Angola muitas pessoas ainda vivem mal” (Correio da Manhã, 9 de Abril de 2012). 
Não nos precipitemos com críticas e comentários apressados, já que a interpretação desta notícia pode não ser tão linear quanto parece.
Procedendo a uma análise hermenêutica, isenta e rigorosa, deste “pedido presidencial” aparentemente tão polémico são várias as conclusões ou ilações possíveis.
A primeira poderá significar um acordar repentino e genuíno de Sua Excelência para a tremenda pobreza que se acumula todos os dias à sua volta, mas que se não vê porque se não quer ver, quase não se ouve porque não se expressa, porque não protesta, porque não tem voz, porque mal alimentada, passando fome, sobrevivendo “com menos de um dólar por dia” [e não inventamos nada, apenas citamos palavras de Filomeno Vieira Lopes em 2004], lhes vai faltando calorias, alento e o fôlego necessários para clamar a sua triste condição. Mas o Senhor Presidente, finalmente, num rasgo de lucidez e de solidariedade institucional dá mostras de pretender acabar com esta mazela social: a pobreza. É de aplaudir. E que faz ele, para que o Mundo saiba que está determinado a corrigir um pesadelo que lhe pesa(rá), decerto, na consciência? Pede “à UNESCO que acompanhe o combate à pobreza.” Ou seja, que observe o que a governação, em boa hora, pretende fazer. Não pede à UNESCO que combata a pobreza que flagela o seu País. Não. Angola tem recursos de sobra, ainda que tenham levado estas últimas décadas umas boas tesouradas para mega-investimentos em prol de quem entende de negócios. Não pede apoio à UNESCO, coisa nenhuma! Essa interpretação só pode ser mesmo com intuito de desprestigiar a honorabilidade de um homem que, embora tarde, decidiu combater o pior flagelo do seu país: a fome. Angola ainda não está precisada de esmolas da ONU ou seja de quem for. 
Uma segunda explicação, defendida apenas por meia dúzia de adeptos, pessimistas e mal-intencionados, consiste na possibilidade, remota, dos imensos recursos angolanos, que muitos julgam infindáveis, estarem mesmo esgotados por terem sido utilizados “à tripa forra” em aplicações fora e dentro do País, em investimentos rentáveis, sim, mas apenas para quem os investiu, sem retorno nem proveito para a grande maioria da população, essa que Sua Excelência diz que “vive mal”. E, nestas circunstâncias, só mesmo a UNESCO poderia dar uma ajudazinha para extinguir o drama da fome e da miséria a que o Senhor Presidente se refere. Contar com apoio da Europa, que está de pantanas, ou com os Chineses, que não são grandes beneméritos, é esperar em vão. Por isso só mesmo a UNESCO. Mas custa-nos a acreditar nesta possibilidade tão radical. Liminarmente, rejeitamo-la. Esta teoria não passa de uma pura especulação utópico-filosófica. O petróleo, o ouro e os diamantes, para não falar noutros recursos, ainda não estão nas lonas. Garantem, seguramente, a todos os diretamente interessados mais uns aninhos de grandes benesses, investimentos e bons lucros. 
Uma terceira hipótese, esta mais plausível, passa pela possibilidade de Sua Excelência pretender ganhar, com toda a transparência, certeza e isenção, as próximas presidenciais. A memória do povo, cá, lá e pelo caminho, é curta e, perante o drama da fome e da pobreza, qualquer dádiva à boca das urnas é balsâmica e apaziguadora. Numa atitude magnânima de governação minimiza-se a fome, ainda que se não possa eliminá-la, combate-se a pobreza, ainda que ela nunca acabe, e a UNESCO poderá testemunhar a grande dimensão de tal estratégia humanitária, ainda que este gesto não passe de um rasgo ornamental de engenharia pragmático-política. 
Uma quarta e última hipótese, só um sonhador ou poeta ousaria concebê-la. Mas que o sonho e a poesia comandam o Mundo, ninguém tem dúvidas.
“Muitas pessoas vivem mal”, diz o seu presidente. Vivem mergulhadas na miséria, na pobreza e na fome. Há pois que lhes dar melhores condições de vida. Há que convidar a UNESCO a presenciar ali, em solo Angolano, o que um governo pode fazer pelos seus cidadãos. É fundamental que o Mundo assista à maior revolução de sempre, pensada e dirigida por um presidente na África Negra. A Comunidade Internacional só acreditará se a ONU, através de um dos seus organismos mais representativos, como é o caso da UNESCO, puder presenciar e testemunhar de perto o maior feito da História Angolana. Eis o cenário, utópico, mas possível:
As maiores cidades Angolanas e, em particular, Luanda, têm sentido estes últimos anos uma profunda transformação arquitetónica e urbanística através da construção de milhares e milhares de residências, condomínios e blocos de apartamentos que conferem a estas urbes e a quem ali vier a residir condições de grande conforto e dignidade. Será que Sua Excelência e os excelentíssimos governantes sob a sua alçada presidencial, em total sigilo, imunes e indiferentes às críticas internas e externas centradas sobre a sua nobre missão governativa não projetam, desde o início, criar um novo conceito de habitações sociais, bem diferente do que assistiu e assiste ao modelo de realojamento ocidental, distribuindo definitivamente casas em massa a quem precisa, a quem “vive tão mal”?! Será que em troca das cabanas imundas que perlavam os bairros de lata dos musseques, arrasadas aos milhares nestes últimos tempos, esta gente desalojada não vai finalmente receber a casa de renda social que nunca teve? O período pré-eleitoral o confirmará. E a UNESCO o testemunhará. E que já era tempo de Sua Excelência distribuir alguma coisa por aqueles que “vivem mal” e nada têm, era. 
Há que sermos razoáveis e darmos o benefício da dúvida a Sua Excelência. Para aqueles que pensam e dizem que o Chefe de Estado Angolano não se apercebe, nem se compadece da real situação em que vive a grande maioria da população, gostaríamos de lhes lembrar que a sua preocupação está bem patente nas citadas afirmações dirigidas à UNESCO.    

Artigo publicado in Jornal O Caravela POA (RGS)
João Frada
Professor Universitário

Medicina Pública ou Privada?

Teoricamente, optar-se apenas por uma única modalidade, a pública, bem dotada e à qual todos, sem isenção ou diferenças de tratamento, tivessem acesso, até faria todo o sentido. Por outro lado, os médicos que se forma(ra)m em universidades públicas deveriam tratar os cidadãos cujo esforço tributário contribuiu também para a sua formação com toda a cortesia e não com indiferença ou quaisquer laivos de xenofobia social, económica ou académica. Profissionais mal formados, no sentido pejorativo do termo, em qualquer área ou setor, sempre os houve e seguramente continuará a haver. Uma árvore, porém, não faz a floresta inteira. Quanto ao acesso a tudo quanto uma medicina de excelência pode oferecer, em todas as suas vertentes de atual oferta médico-cirúrgica, isso, também numa verdadeira sociedade democrática onde se pratique a equidade na redistribuição de riqueza, no acesso ao emprego, na justiça, na educação e, sobretudo, na saúde, deveria acontecer. Mas nem as sociedades são democráticas, no sentido pleno do termo, nem o dito acesso é igual para todos. A medicina e a saúde que ela pode propiciar, a par de uma boa qualidade de vida higiénica e alimentar, lamentavelmente e por múltiplas razões não acessíveis a toda a cidadania, podem e devem ser encaradas como bens de natureza pública e, como tal, deverão ser facultadas a qualquer cidadão, seja qual for a sua condição económica ou social. Deste modo, enquanto houver ricos e pobres, abastados e remediados, classes altamente privilegiadas e deserdados da sorte, castas alta e baixas, realidade tão comum na maior parte dos países, a medicina há de ser sempre diferente para uns e para outros. Só numa sociedade democrática utópica é que a saúde e a medicina poderiam ser iguais para todos, em termos de acesso a recursos humanos, técnicos e tecnológicos de natureza diagnóstica ou terapêutica, independentemente da raça, da condição social e económica ou do estatuto académico. Porém, onde existe tal sociedade? Quando muito, os praticantes da medicina pública, querendo aperfeiçoar-se e otimizar recursos, poderão exercer uma arte mais hipocrática, mais racional e humanista, disponibilizando a todos os seus utentes os melhores meios ao seu alcance. 
Temos mesmo que conviver com a medicina pública e com a medicina privada. O dinheiro, quer queiramos quer não, traça grandes diferenças em termos de oferta e de procura. Os Estados e os seus gestores não vivem de utopias nem as alimentam.

João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 06.09.13

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Nem tudo o que se ouve e lê é de fiar…


Seguramente, deverá ser mais uma calúnia em torno do PM, mais uma falsidade que levantam sobre a sua honorabilidade, porque jamais um homem como ele poderia ter afirmado tal coisa e, depois, vir a assumir exatamente o contrário, sujeitando-se a que alguém, mais azedo e indelicado, ouse beliscar a sua árvore genealógica, batizando-o a ele e à sua excelentíssima mãe com algum epíteto menos conveniente. Pelo nosso lado, não acreditamos “nesta”. Uma “abrilada”, ainda por cima, mais do que ultrapassada, das calendas de 2011...coisas do passado que não devem ser totalmente levadas à letra.
Não nos podemos fiar em tudo o que se diz aqui e por aí, senão não haveria adjetivos que chegassem para classificar tantos desmandos e despautérios que, só por má-fé, atribuem aos nossos esforçados e estoicos políticos e governantes, altamente empenhados em equilibrarem o malfadado défice, em cortarem o mais que podem nas suas próprias gorduras, isto é, nos gigantescos gastos do Estado, em obrigarem todas as castas, incluindo as especiais, a participarem no enorme movimento de solidariedade nacional. E agora, pasme-se, assegurou o PM, até se irão cortar 15% nas pensões vitalícias de uma data de dom sebastiões que, pelo seu esforço e dedicação imensos, salvaram o país, resta saber de quê…há quem diga que lixaram o país e as finanças públicas com um “f(efe) dos grandes”, mas temos a certeza de que se trata de mais um boato, uma falsidade. Eles eram lá capazes disso?! Apenas para que se medite no quanto as bocas do mundo são capazes, perguntamos: acham que alguns destes excelsos portugueses, abnegados e paladinos da moral, da ética, da lisura, da honestidade e da transparência merecem que lhes cortem as ditas pensões vitalícias, ganhas com tanto sangue, suor e lágrimas, em prol da nação e da sociedade que serviram e servem com tanta devoção e sacrifício? A comunicação social aponta uma série deles, mas elencamos aqui os mais conhecidos – Dias Loureiro, Duarte Lima, Carlos Melancia (o do aeroporto de Macau), Zita Seabra, Ângelo Correia, Bagão Félix, António Vitorino, Armando Vara, Rui Gomes da Silva, Joaquim Ferreira do Amaral, Álvaro Barreto.
Nesta leva de moralização fiscal, arrepiante, diga-se de passagem, os nossos governantes, com o PM a orientar as manobras, não irão lixar apenas, e mais uma vez, os abastados pensionistas e reformados, perdulários que gastam à tripa forra as brutais pensões de reforma que auferem, desbaratando-as em comes e bebes e em constantes viagens ao Algarve, à Costa da Caparica, à Madeira, ao nordeste brasileiro, etc., etc.. Não. Os ditos pensionistas vitalícios também irão sentir a espada de Dâmocles sobre as suas magras receitas. Mas há mais novidades: pelos vistos, até a CGD e o Banco de Portugal vão ter de participar neste esforço solidário, ainda que sem grande vontade de alinhar nesta estratégia. O Banco de Portugal, como, pelos vistos, se considera um Estado dentro do Estado, acima da lei, portanto, não está muito convencido a participar nestas invenções solidárias ditadas pela troika e subscritas pelo PM e pela Ministra das Finanças. Ainda está a decidir, o dito banco de Portugal, se sim, se não, vai mesmo prescindir das suas intocáveis regalias. Terá de consultar o Banco Central Europeu sobre o assunto.
O PM, claro, como é um homem tolerante, não com os pacóvios dos reformados e pensionistas,… esses têm de ser orientados a chicote, como merecem, já que o apupam, vaiam e lhe lixaram o seu adorado PSD nas últimas eleições…, mas com esta gente de estirpe que ele próprio colocou ou então que lhe aconselharam a colocar no Banco de Portugal e em outros lugares cimeiros da Banca e das Finanças, não pode entrar em choque com estes notáveis. É uma questão de bom senso político, de cautela e de espírito de sobrevivência. É preciso compreender as suas dificuldades, as suas limitações, os seus constrangimentos, os seus compromissos inconfessáveis, mas também a sua resistência e o seu estoicismo à testa da governação que, como um barco navegando no meio de escolhos e sem carta de navegação, vai rumando em busca de um porto que parece não existir em lado nenhum.
Apesar de tudo, não é justo termos à frente dos nossos miseráveis desígnios gente como esta, homens que nos governam com gana, que repudiam FMI/troikas, que gerem este país com ponderação, cerebração inteligente, altruísmo, ética , moralidade transbordante, espírito magnânimo e profundo desinteresse por bens materiais e, depois de toda esta dedicação, ouvirmos baboseiras que não só os envolvem a eles, distintos filhos de suas mães, como a estas, coitadas, profundamente alvejadas na sua dignidade feminina. Sempre misturadas em epítetos infelizes, sem serem de facto responsáveis, a priori, pelas faltas de carácter dos seus preciosos “rebentos”. Mas há comportamentos desviantes, taras e tendências que, seguramente, só encontram a sua explicação na genética, insistem os mais cientisto-pessimistas e, neste caso, quem nos diz que as desgraçadas das mães destes salafrários, vendilhões da nação, não devam também serem chamadas à pedra?! Por isso, quando alguns mais desbocados lhes dão, despudoradamente, roda de "filhos de ou da outra senhora", poderão ter, lá no fundo, alguma razão, no protesto, não na forma. De qualquer modo, repudiamos vivamente quem faz uso desta linguagem de uma forma gratuita e, voltando à questão inicial, reprovamos, vivamente, quem passa a vida a levantar falsos testemunhos deste quilate.
Analisando, porém, a frase que atribuem ao PM, e que tanta polémica causa, incluindo artigos especulativos como este, consideramos que ela, a frase, até encerra “uma espécie de moral da história”.
Ponderando bem, a dita afirmação, a ser emitida pelo PM, é ou foi, indiscutivelmente, um bom conselho. Ora medite-se sobre o seu conteúdo: "aqueles que fizeram os seus descontos têm hoje direito às reformas e pensões e deverão mantê-las no futuro"... é um excelente conselho", e avisa em seguida: "sob pena do Estado ficar com aquilo que não é seu". É claro que quem descontou tem que cuidar do que é seu, criar as condições para manter futuramente tais reformas, porque se não for capaz disso, o Estado pode vir a apropriar-se delas. Infelizmente, os idiotas dos reformados não têm conseguido nem sabido manter as ditas reformas a que julgavam, tolamente, ter direito e, como o PM previa, alguém pode abarbatar-se com elas. Pacificamente, o pessoal, bovino e manso, tem abdicado, sem grande luta, das ditas reformas e pensões e, nessa medida, se há alguém precisado de solidariedade é o Estado, que as recebe de braços abertos. É o candidato número um para este gesto filantrópico e solidário dos reformados e pensionistas portugueses. Ponto final.
De resto, cumpre-se o provérbio popular: quem perdeu, perdeu, quem achou é seu. Ora, o Estado limita-se a ficar com aquilo que alguém perdeu. O que está em Portugal é dos portugueses, diz o povo que é sábio, mas o que é dos portugueses também é de Portugal… esta última certeza, com tanta coisa à venda e já vendida, não é hoje completamente verdade, tenha-se isto em conta. Mas não será o Estado, em primeira e última instância, quem deve ficar com aquilo que é ou era dos portugueses? É claro que sim. É uma lógica confuciana, é certo, mas só quem não quer perceber é que não percebe e se atreve a lançar piropos indecentes, sórdidos e indecorosos a um homem como o PM.
Há que ter tento na língua e não acreditar em tudo o que se diz e lê.

João Frada
Professor Universitário

domingo, 6 de outubro de 2013

AINDA RUI MACHETE E OS FORMULÁRIOS E BUROCRACIAS

Na verdade, a menos que, subjacentes ao “sentido pedido de desculpas de Rui Machete”, existam  mais algumas razões de índole pessoal ou política, eventualmente, encomendadas pelo próprio PM, visando melhorar o clima relacional entre os dois países, tão sujeito estes últimos tempos a “fortes ventanias”, clivagens e fricções exacerbadas pela comunicação social de ambos os lados, em torno dos processos judiciais em causa, envolvendo altas figuras do governo de Angola, apaziguamento a que nós aludimos e que o próprio PM se referiu ontem, entendemos que as gaffes do senhor ministro dos Negócios Estrangeiros não passam disso mesmo: gaffes, não no sentido literal do termo, mas de excessos de boa vontade político-diplomática, ainda que correndo o risco de “perder a face”, pondo-se de cócoras ou de joelhos, como quiserem vê-lo, de modo a assegurar que os milhares largos de portugueses residentes em Angola ali possam continuar a trabalhar sem grandes complicações…porque são brancos e vistos, por muitos, como herdeiros de colonialistas e, nestas coisas, mal vale prevenir…, porque dão um grande jeito às nossas finanças, tão falidas, as contínuas divisas e os imensos capitais que de lá vêm, estes últimos agora mais contidamente, porque se levantou a suspeição de que Portugal era um destino preferencial para branqueamento de capitais, porque somos países irmãos e não faz sentido estarmos desavindos, apenas porque vários figurões angolanos estão a contas com a justiça, neste caso com a PGR.
“A senhora Procuradora-Geral deu informações genéricas, como aliás foram pedidas, que nos asseguraram que as coisas não tinham nenhum grau de gravidade”, afirmou Rui Machete. 
(…)
 A PGR apressa-se a desmentir tais afirmações, afirmando que se "encontram pendentes no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) vários processos em que são intervenientes cidadãos angolanos, quer na qualidade de suspeitos, quer na qualidade de queixosos". O mesmo comunicado sublinha que estes processos se encontram em "segredo de justiça", sendo o seu conteúdo acessível "só aos intervenientes processuais a quem a lei confere tal direito. 
(…)
É neste sentido que a PGR deixa a garantia de que Joana Marques Vidal – ao contrário do que afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros Rui Machete na entrevista à Rádio Nacional de Angola (RNA) a 18 de Setembro - "nunca proferiu qualquer comentário sobre o conteúdo daqueles processos, nem teceu considerações com ninguém sobre quaisquer processos sujeitos ao regime do segredo de justiça".
“O Ministério dos Negócios Estrangeiros emitiu um esclarecimento: Rui Machete diz que nunca fez perguntas à Procuradoria-Geral da República ou a qualquer instância judicial sobre processos”. 
O senhor ministro dos Negócios Estrangeiros, pelos vistos, deu o dito por não dito. Esse, sim, foi o seu último grande deslize. Mais um. Se bem se lembram também nunca tivera ações na Sociedade Lusa de Negócios ligada ao BPN, conforme assumiria em novembro de 2008, e ocultou enquanto pôde este interesse pessoal, sabendo que isso colidia com o cargo que iria assumir, o de ministro dos Negócios Estrangeiros. 
Resta saber se continuará a deslizar e por quanto tempo, atendendo ao facto de que não destoa dos demais companheiros de equipa, porque “dar constantemente o dito pelo não dito e deslizar” têm sido as notas mais comuns entre quase todos os membros da atual governação.

João Frada
Professor Universitário 

sábado, 5 de outubro de 2013

RUI MACHETE E A PGR: “Burocracias e Formulários”

Apetece-nos, como já vai sendo habitual, tecer um comentário sobre este comunicado, embora entendamos que não estamos preparados para tal análise, mesmo porque o processo jurídico que diz respeito a este facto, a ser verdadeiro, se encontra ainda sob sigilo judicial e, como tal, é-nos difícil saber se os ditos simples formulários e burocracias a que Rui Machete se terá referido são mesmo tão simples assim, como ele pretendia. É sempre bom e útil ouvir quem sabe do assunto e, nós, armados em analistas, nem sempre somos os mais indicados para tecermos considerações com a devida propriedade sobre matérias tão fora do nosso alcance. Mas podemos observar pela rama a questão, tal como nos retrata a notícia, não propriamente em relação à investigação jurídica, aos conteúdos dos processos ou à eventual ação penal que daí possa resultar, mas no que toca à figura cómica de Rui Machete, de cócoras ou de joelhos, desculpando-se junto dos governantes angolanos…e não assistimos ao seu pedido de desculpas…, apaziguando a sua consciência, a do governo que representa e, sobretudo, a dos suspeitos angolanos visados pela PGR, procurando reduzir todo um processo a meras “burocracias e formulários”, processo que não conhece e ao qual, aparentemente, não tem acesso nem teve acesso, apenas para que todos possam ficar bem na fotografia, especialmente ele, na sua distinta condição de Ministro dos Negócios Estrangeiros…mas a PGR, pelos vistos, ou não anda lá muito fotogénica ou não gosta de fotografias a preto e branco.
João Frada
Professor Universitário

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Memórias históricas de um analista “pro bono” e a descida do IVA em 1%

Um por cento (1%) de IVA era o que este animal político defendia como medida absolutamente salvítica da economia nacional e, como seria de esperar, teso como era e continua a ser, não se intimidou perante as diversas franjas parlamentares de bacocos que, só para o irritarem, pensamos nós, decidiram questioná-lo sobre o valor irrisório da descida. Respondeu-lhes à letra, como mereciam: frase lapidar, que nos ficou na memória, perante a qual toda aquela onda opositora se esfumou, silenciosa, convencida e decerto arrependida: "Meus senhores, uma descida de 1% de IVA só é desprezível para os ricos", não para os portugueses que trabalham e lutam em condições bem conhecidas por todos...este acréscimo é nosso, mas traduzirá, decerto, o que ia na alma do nosso 1.º Governante. Valente reprimenda. Gostei.
Oito ou dez dias depois, e a data aqui não tem significado, o Sr. Ministro das Finanças, no espaço do mesmo Parlamento, a propósito da aplicação de dinheiros públicos em offshores, nomeadamente, dos Fundos de estabilização financeira da Segurança Social, beneficiária de isenção de impostos coletivos, perante a exigência da oposição em esclarecer quais os capitais investidos, qual o retorno dessa aplicação, indubitavelmente de risco, e quais os benefícios que daí poderiam advir para a mesma Segurança Social, até há bem pouco tempo, na sua ótica, incapaz de sobreviver para além de 2015, fez saber, quando interpelado, não sem um pouco de crispação, que os milhões de dólares investidos, bem como os lucros resultantes, não passavam de uma gota de água, uma insignificância no contexto geral do orçamento geral do Estado e das respetivas verbas em jogo. O problema é que se trata de dinheiros públicos, de todos nós, dos trabalhadores, e temos algumas dúvidas se estas apostas vem beneficiar em alguma coisa o trabalhador que suporta desde sempre esta pesada máquina do Estado, com reduzidas, mal contadas e muito pouco seguras recompensas. Diremos, mesmo, que nenhumas, a avaliar o rumo que as coisas têm vindo a assumir. Os ricos continuam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Um por cento é desprezível...para os ricos, e a aplicação de milhões de euros aplicados em offshores trata-se de uma insignificância, que não justifica nem deve merecer preocupação de ninguém, porque não tem grande peso na economia e segurança social do País. Um Paradoxo. Ou não?! Mas paradoxos só podem ser compreendidos à luz de teorias paradoxais e isso é domínio da matemática e da probabilística e não me parece que os nossos leitores possam estar agora interessados em prestar provas nesta área, não exigidas, nem ainda impostas pelo Ministério da Educação a toda a cidadania. Seguramente, os resultados dessa aferição de competências não seriam 100% positivos. Mas, pelo menos, esta disciplina, como não se expressa em inglês, não foi suprimida.  
João Frada
Professor Universitário 

BIORRITMOS E INSUCESSO ESCOLAR: algumas opiniões e reflexões

A criança é fruto da genética, do ambiente social e cultural. 
Nem sempre, porém, os modelos e sistemas reguladores da educação e do comportamento estão suficientemente adaptados à realidade. Definem-se e estabelecem-se programas educativos que, numa perspetiva sociológica, psicológica e cognitiva, são considerados com a resposta metodológica mais eficaz à transmissão de conhecimentos, à formação do saber e da consciência fundamental e imprescindível para o desenvolvimento das capacidades de adquirir capacidades ou, como diria Vítor da Fonseca, a “aprender a aprender”. As diversas estratégias escolares, de natureza formativa e educacional, visam preparar os jovens para as suas futuras apostas sociais, familiares, emocionais e profissionais e, nessa medida, pretendem ser os instrumentos essenciais para esse êxito multidireccionado, ao longo das suas vidas. A Escola e o Professor, os Programas e as Estratégias de ensino, hoje mais do que nunca, globalmente, enquanto agentes atuantes de formação, não visam indivíduos, mas o grupo, não obstante a atenção específica dispensada a alguns deles, mais carentes de uma aprendizagem mediatizada e, por vezes, personalizada. Esta situação é comummente considerada quando a Escola se confronta com jovens com carências de determinadas “capacidades cognitivas para a resolução de problemas” [1]. 
Mas, apesar das sucessivas experiências e dos múltiplos contributos teóricos no campo da pedagogia e da pedo-psicologia educacional, constatamos, no terreno prático do ensino, que há sempre uma percentagem enorme de insucesso escolar. As razões, umas, talvez não muito difíceis de descortinar à luz das ciências biomédicas, explicativas da grande diversidade de comportamentos, bem como das grandes diferenças observadas em relação à procura do saber, ao grau de curiosidade, ao nível de labilidade da atenção, ao coeficiente de inteligência, à maior ou menor apetência cognitiva, à capacidade de memória exercitada, outras, de índole socioeconómica e política, no seu conjunto, acabam, sempre, por favorecer assimetrias de formação que muitas vezes não são possíveis de corrigir pelo docente ou pela Escola e se traduzem, mais tarde, na vida adulta, em disfuncionalidades cognitivas pouco identificadas com o sucesso pessoal, académico e profissional.
Há estudos recentes de neurofisiologia de sono que parecem apontar para a noção de que a criança, à medida que se aproxima da puberdade, “experimentando”, naturalmente, as profundas alterações biopsicológicas e, em particular, neuro-hormonais que marcam o seu desenvolvimento, parece sofrer uma espécie de atraso no “seu relógio biológico, ou seja, passa a dormir mais tarde e a acordar também mais tarde”. [2] Isto leva a que muitos jovens, de idade escolar, revelem, durante a primeira fase de aulas, ou seja, pela manhã, grande dificuldade de concentração e de aprendizagem, sobretudo, quando confrontados com “matérias mais complicadas” [3]. Os agentes e mecanismos neuro-hormonais responsáveis pelo estado de vigília, em alguns indivíduos, apenas entre o meio e o final da manhã garantem um estado de atenção e de lucidez cerebral e cognitiva suficientes para o processo de aprendizagem participativa e interativa.
Há contudo a noção, entre outros autores (A. Gomes, J. Tavares e M. Azevedo), de que se podem classificar os indivíduos, neste caso as crianças, de uma forma geral, em dois grupos distintos: os matutinos, madrugadores ou cotovias e os verpertinos, noctívagos ou mochos [4]. Para estes investigadores, “a maioria da população encontra-se numa posição intermédia”. Os primeiros, “cotovias”, com ritmos biológicos responsáveis por um estado de vigília matinal, são claramente mais adaptados à primeira fase do dia; os últimos, “mochos”, com um ciclo de vigília-sono bem diferente, sofrendo de grande sonolência durante a manhã, manifestam frequentemente graus de interesse e de atenção diminutos que podem ameaçar inexoravelmente o seu desempenho escolar. Por outro lado, o processamento de informações cerebrais e cognitivas, bem como a consolidação de memórias e aprendizagens, parecem depender do número de horas de sono, do seu horário e da regularidade em que ele se estabelece. 
“Quanto à quantidade de sono necessária para se funcionar adequadamente, sabe-se que a privação de sono afeta, entre outras funções cognitivas (…) o pensamento divergente e flexível, a capacidade para lidar com a surpresa e a novidade, a fluência verbal, a emissão de respostas inovadoras” e a capacidade de emitir respostas simples e rotineiras (Horne, 2000) [5]. 
Com horários de estudo e de trabalho que se prolongam muito para além do período de presença na Escola, na qual permaneceram 8 ou 9 horas seguidas, muitos jovens e crianças têm que ultimar ou preparar em casa, lições, trabalhos académicos e tarefas que, de um ou de outro modo, acabam por interferir nas normais horas de descanso noturno, gerando alguma privação e irregularidade no ciclo de vigília-sono.
Por outro lado, por razões socioeconómicas e culturais nem sempre as mais recomendáveis, as sociedades e a maior parte dos jovens, arrastados muitas vezes pelo exemplo dos seus familiares, alheios, ignorantes ou demitentes na/da sua condição de educadores, tutores ou disciplinadores, tendem cada vez mais a identificar-se, em termos de horários tardios de atividade e de vigília, com o último grupo, dos “mochos”. Para este grupo, o sono assume uma importância secundária e processa-se com uma irregularidade, quantidade e qualidade de consequências pouco reparadoras, face às enormes motivações e solicitações dos meios audiovisuais, entre eles a TV e a Internet. Interrompido, precocemente, pelas 6 ou 7 horas da manhã, o período de sono essencial ao equilíbrio e rendimento físico, mental e psicológico destes indivíduos, crianças e jovens, não é minimamente compatível com o horário de escolaridade a que muitas vezes estão sujeitos. 
Dos estudos e revisões efetuados pelos investigadores cujas fontes constituíram a base da nossa reflexão, pode-se concluir “com horários de sono tardios apresentaram piores resultados escolares(…)”. Os alunos mais vespertinos, que adotam horários de sono-vigília mais tardios [6], por razões plausíveis, positivas ou não, podem ter pior desempenho escolar, apenas porque os horários escolares não são ajustados aos seus padrões biológicos de sono-vigília.
Esta é uma questão importante a ponderar, se algum dia os responsáveis pelas políticas de educação pretenderem compreender e corrigir o insucesso escolar verificado entre os jovens portugueses. As causas deste problema não se situam seguramente no ensino secundário, mas enraízam-se no próprio ensino básico ou mesmo pré-escolar. Hábitos saudáveis, criam mentes saudáveis.
Seria interessante estabelecer inquéritos ou questionários sobre hábitos de sono ou de vigília e poder relacioná-los com comportamentos e aproveitamentos escolares. Talvez pudesse vir a ser uma achega importante para a compreensão e correção deste problema que, aparentemente, gerado na infância, se vai agudizando na adolescência, conduzindo a níveis de insucesso escolar consideráveis. Em Portugal, segundo recentes estatísticas, cerca de 50 a 60 mil jovens não passam do 9.º ano de escolaridade. 
Criar grupos de alunos, de acordo com a sua natureza biopsicofisiológica e enquadrá-los em horários mais ajustados aos seus biorritmos, poderia ser, futuramente, entre outras medidas, uma das chaves para a diminuição do insucesso académico e profissional. 
Bibliografia
FONSECA, Vítor da, Aprender a Aprender: a educabilidade cognitiva, 2.ª edição, Lisboa, Âncora Editora, 2007
GOMES, Ana A., TAVARES, José, AZEVEDO, Maria Helena, Padrões de sono-Vigília e (In)sucesso Académico no Ensino Superior, 13 p.(http://www.ualg.pt/OPQE/fases/2/comunicacoes/allengomes-tavares.htm)
MELLO, Luciana, Os Ritmos Biológicos e os Horários Escolares (http:www.crono.icb.usp.br/horariosescolares.htm) 
S.a., Estudar pela manhã pode prejudicar rendimento escolar (http://www.ccs.usp.br/espacoaberto/marco99/noticias.html) 

João Frada
Professor Universitário 

Portugal e o Crónico Complexo da Pequenez

A ideia de discorrer sobre este problema, “o nosso eterno complexo da pequenez”, não é original. Já foi tratada e “retraçada” por muitos outros articulistas e analistas, mas nunca é demais proceder a mais uma “catarse”. O doente de foro psicológico (e quem é que actualmente, e neste estado de coisas, está imune à doença) raramente melhora na primeira sessão de análise. Repete-se, rebusca-se, “introspecciona-se” ou “extrospecciona-se” umas tantas vezes, organiza as suas ideias desarrumadas e acaba por encontrar algum equilíbrio fundamental à coexistência pacífica dos seus estados de espírito (emoções, complexos, frustrações, medos, revoltas, traumas e impotências) e do seu instinto de sobrevivência.  
Há 500 anos, ansiosos por sair da nossa pequenez, rumámos ao desconhecido e na pertinácia e ousadia fomos capazes de impor a nossa língua, a nossa cultura, a nossa raça pelos quatro cantos do Mundo. As vicissitudes, porém, ontem como hoje, eram muitas e depressa perdemos o fôlego numa tarefa que nada tinha de liliputiana. Faltou-nos a organização, a solidariedade individual e colectiva, a sobriedade institucional, a honestidade, a visão projectada no futuro. Minados por uma “tendência quase hereditária” para o facilitismo,  corrupção e venalidade, rapidamente voltámos à nossa pequenez.  
Acabou-se-nos o afluxo das especiarias do Oriente e o ouro do Brasil, e, na segunda metade do século XX, não soubemos encontrar o rumo civilizacional que haveria de nortear quase todos países europeus na reestruturação social e económica do pós-guerra. Orgulhosamente sós, alheados das novas realidades empresariais, tecnológicas e científicas, voltados para a nossa pequenez e para as colónias, onde também apenas implantámos a mesma forma de ser e de estar, sempre pequenez, perdemos uma  nova etapa ou oportunidade de progresso e desenvolvimento e distanciámo-nos mais do pelotão da frente. Acabada a “teta”colonial, que só serviu para a amamentação de alguns, com magros recursos e pobres ideias, não apostámos na educação das nossas gentes, alimentámos o analfabetismo e a ignorância, distribuímos bulas e credos benfazejos de bem-estar individual e social, fazendo crer que a nossa sina era vontade de Deus e que o vinho, não a instrução, dava de comer a um milhão de Portugueses. Até poderia dar, se, na altura própria, depois da nossa entrada na Comunidade Europeia, com torrentes de fundos estruturais, escoando anos seguidos para o nosso País, tivesse sido criteriosamente definida e orientada a sua aplicação em projectos de viticultura rentáveis, sérios e economicamente viáveis, geradores de emprego, riqueza e desenvolvimento social. Metade dos avultados subsídios europeus (milhares de milhões de euros), caíram directamente nos canais e esgotos da corrupção e da venalidade. A marca da pequenez, em relação a objectivos e a valores positivos, uma espécie de contrafacção que os governos sucessivos teimam em continuar a produzir, apesar dos protestos cada vez mais sonoros de rejeição, audíveis em todos os quadrantes sociais e políticos, continua a substituir a ideia de um futuro próspero, com melhor qualidade de vida e saúde física e mental para a grande maioria dos Portugueses, esses que representam e sentem na pele a pequenez das suas condições de vida, a pequenez da empregabilidade (pelo desemprego ou pelo emprego precário ou temporário, mal remunerado), a pequenez alimentar pela magreza de recursos, a pequenez de alegria e de bem-estar pela carga fiscal, directa e indirecta que os avassala, a pequenez de formação que lhes não garante capacidade competitiva neste mundo global, e a pequenez demográfica das famílias portuguesas, como é óbvio, pouco incentivadas e apoiadas pelo Estado, no domínio da educação, da saúde e de toda a logística económica e formativa exigida por qualquer criança, não apenas na idade escolar.
Querem-se meninos inteligentes, competitivos, criativos, aptos a receber formação continuada e “de excelência”, mas, paralelamente, os seus pais vivem numa permanente angústia de subemprego, de desemprego ou de emprego precário ou de baixos salários), querem-se jovens com preparação técnico-profissional, universitária ou não, para apostar na grande competição tecnológica e económica que marca cada vez mais as sociedades industrializadas e desenvolvidas do século XXI. Para qualquer recém-licenciado ou jovem, porém, a aposta convicta na educação e na formação contínua, especializada e prática, conducente ao êxito profissional e laboral, perante a crescente pequenez da economia portuguesa, afogada no desemprego, no miserabilismo salarial e na permanente ausência de oportunidades, visível em todos os sectores, industrial, tecnológico ou científico, é um esforço, um apelo, pouco convincente. E assim, sem grandes perspectivas de futuro, ou emigram, “ofertando” a sua inteligência e a sua capacidade produtiva e criativa além fronteiras, e o recente meeting de cérebros portugueses em troca de melhores contrapartidas, ou desistem a meio da sua formação escolar, engrossando o pelotão de gente impreparada, analfabeta, incapaz de ser competitiva, num mundo laboral cada vez mais exigente e pautado por regras de mérito e excelência. Na nossa pequenez, não apostamos suficientemente na nossa juventude. As condições impostas pela nossa pequenez política e governativa, mais apostada em ultrapassar algum trauma arquetipal com obras megalómanas, de fachada, estádios, aos montes, centros e exposições culturais, que nos levam anéis e dedos, megaestruturas ferroviárias e aeroportuárias, o mais onerosas possíveis, “como manda a tradição”, resultam, obviamente, num corolário económico inevitável: os elevados gastos exigidos por tais projectos, que até poderiam ser compreensíveis se ponderados com equilíbrio, rigor, transparência e sentido de Estado, conduzirão, impreterivelmente, uma vez mais, a uma abundante sangria dos habituais “dadores involuntários: a classe média, os funcionários públicos, os trabalhadores por conta de outrem e todos aqueles que, sendo uma grande maioria demográfica, vivem na anemia económica, social, educacional, sanitária e agora quase afónica, deste país. As minorias economicamente privilegiadas, da grande indústria, dos bancos e seguradoras, com acesso a energias mais baratas (electricidade, gás, combustíveis, a tributos muito mais baixos (patentes em IRC, isenções, etc.) e a lucros anuais fabulosos, bem como as franjas “fora do sistema”, algumas delas movimentando milhões de euros, e o negócio da contrafacção é a prova disso, continuam a não participar no esforço económico e fiscal que é ou deveria ser de todos, mas, lamentavelmente, cabe só a alguns aguentar. Sentido de equidade, de justiça, de moralidade, perderam-se completamente na vertigem dos sucessivos governos que temos eleito. Será que a nossa permanente pequenez, e falo pela grande maioria dos que, estoicamente, suportam o sistema, é uma condição sócio-genética irreversível? Talvez não. Se todos participassem ou tivessem que participar mais no esforço conjunto do sistema, os mais ricos continuariam pouco afectados e os menos ricos viveriam mais desafogados. Se os mais abastados pagassem um pouco mais (e medite-se, por exemplo, nos lucros fabulosos dos bancos portugueses nos 2 últimos anos) e aqueles que pouco ou nada pagam, através de adequados mecanismos fiscais (cruzamentos de dados informáticos, contas bancárias, sinais exteriores de riqueza, registos de bens e património, leasings, seguros, cartas de condução, etc.), pagassem também à sua escala, então, através desse esforço conjunto mais harmonioso e justo, poder-se-ia, gradativamente, baixar o miserável e pseudo-provisório imposto IVA de 23%, que empobrece Portugal e todos os portugueses, em particular, os que constituem a pequenez económica do país. Não acredito em iluminados e esta receita não fará de mim um iluminado. Os especialistas em Finanças públicas já terão pensado nestas e em outras hipóteses, quantas vezes? As ideias de muitos políticos que têm passado pela governação e podemos apontar, entre outros, o  Eng.º. João Cravinho, preocupados com a a evasão e corrupção fiscal, afloraram, com grande rigor as diversas medidas capazes de limitar esse cancro da economia nacional. Então, o que tem faltado ou falta  ao governo para as pôr em prática?  Ousadia política? Até nisto somos exemplo de pequenez política. Corrigindo uma boa parte dos 40 mil milhões da economia paralela, equilibrávamos a nossa balança externa, corrigíamos o malfadado défice e libertavamo-nos de vez das troikas e dos FMI. De outro modo, serão sempre os mesmos a apertar o cinto e, na verdade, a grande maioria só tem mesmo um cinto para apertar. À nossa volta, porém, quantos vemos com 2, 3 ou mais cintos, bem largos, que mal sentem aperto ou nunca foram (ou virão a ser) apertados. A lei e as obrigações destinam-se apenas a quem usa um cinto. Quem detém mais do que um ou usa suspensórios fica isento ou nem dá por isso. É pena, porque se a vontade política dos nossos governantes não se pautasse, apenas, pela pequenez e fosse mais recta e abrangente, os Portugueses acreditariam mais nos seus representantes, nos seus deputados, na sua governação. 
Com mais receita, obtida à custa de uma política séria de equidade e de justiça, baixavam-se os impostos e os preços energéticos, fixavam-se e atraíam-se novas empresas, dissuadiam-se as deslocalizações de outras, tornava-se o nosso mercado económico mais aliciante, aumentava-se a possibilidade e a oferta de emprego e de salários, reduziam-se fricções laborais e sindicais, garantiam-se boas margens de lucro empresariais, com subsequentes estabilidade de emprego e ganhos familiares mais justos e duradouros. A economia rejuvenescia, a maioria das famílias portuguesas sairia, lentamente, da situação de pequenez  económica, frustrante e doentia, em que se encontra, estancar-se-ia definitivamente a emigração das nossas gentes (incluindo imensos jovens cientistas que, por ineficácia do sistema, nunca mais virão trabalhar no seu País), a educação revelar-se-ia um bem fundamental para todas as gerações, as de hoje e de amanhã, e a sociedade portuguesa encontraria, certamente, algum bem-estar e qualidade de vida.
Enquanto os nossos governantes não apostarem nestas transformações obrigatórias, acreditando que encontram, apenas, a solução dos problemas da crise através de um maior controlo fiscal, sempre  dirigido contra à classe média, congelando salários (seria melhor chamar-lhe hibernação plurianual, indeterminada), não olharem para uma distribuição equitativa e justa desse esforço tributário, aplicado a todas as classes sociais e profissionais, não regularem o custo de vida, em particular, no que se refere a necessidades básicas, não controlarem as [suas próprias] despesas públicas, esbanjadoras e perdulárias, evitando desperdícios e vícios de gestão com pareceres jurídicos e com gastos supérfluos, enquanto não houver uma entidade, isenta e neutra, que regule, imparcialmente e sem pressões, os gastos do próprio Estado, Portugal nunca passará da pequenez em que se encontra. Alhearmo-nos desta realidade é aceitarmos, definitivamente, a nossa condição de pequenez económica, política, cultural e social num Mundo cada vez mais global e em desenvolvimento.

João Frada
Professor Universitário

OS REFORMADOS


“Aprovado o OE 2013, Portugal arrisca-se a entrar no "Guinness Fiscal" por força de um muito provavelmente caso único no planeta: a partir de um certo valor (1350 euros mensais), os MATEM pensionistas vão passar a pagar mais impostos do que outro qualquer tipo de rendimento, incluindo o de um salário de igual montante! Um atropelo fiscal inconstitucional, pois que o imposto pessoal é progressivo em função dos rendimentos do agregado familiar [art.º 104.º da CRP], mas não em função da situação activa ou inactiva do sujeito passivo e uma grosseira violação do princípio da igualdade [art.º 13.º da CRP].
Por exemplo, um reformado com uma pensão mensal de 2200 euros pagará mais 1045 ¤ de impostos do que se estivesse a trabalhar com igual salário (já agora, em termos comparativos com 2009, este pensionista viu aumentado em 90% o montante dos seus impostos e taxas!).
Tudo isto por causa de uma falaciosamente denominada "contribuição extraordinária de solidariedade" (CES), que começa em 3,5% e pode chegar aos 50%. Um tributo que incidirá exclusivamente sobre as pensões. Da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações.(…)”
Por António Bagão Félix
Estas e outras considerações a que todos temos acesso levam os ânimos ao rubro. 
Perdoem-se os mais sensíveis, pela linguagem que a seguir se transcreve, traduzindo um sentimento global que aqui, entre internautas, se não consegue de todo ultrapassar e que, por isso mesmo, mereceu a minha humilde análise.
Leem-se comentários por todo o lado, aqui na Internet, de gente que se interroga, despudoradamente, se um Ministro, primeiro ou segundo, não importa, em plena e zelosa governação, invocando razões de moralidade, equidade, justiça e solidariedade, por ter decidido aplicar em 2014 mais uma penalização a quem já está mais do que sangrado nas suas magras reformas e pensões, ou seja, um imposto novo extraordinário aplicado a pensionistas e reformados, deixando de fora várias castas especiais, diplomatas e magistrados jubilados e outros altos funcionários da administração pública com os mesmos privilégios,  deve ou não ser considerado “um filho de puta” ou “um filho da puta”?! Achamos que, semanticamente, este adjetivo é desajustado e merece o nosso maior repúdio, seja ele considerado "de" ou "da"...e, seguramente, ao contrário do caso do presidente “de” e “da” Câmara, nem precisamos de qualquer opinião interpretativa judicial superior. A ir por diante tal imposto, de certeza que não irão faltar adjetivos bem mais justamente adequados, capazes de traduzir esse excelso sentido de equidade e de justiça ministerial…ou talvez não. Poderão mesmo faltar vocábulos ajustados à necessária classificação dessa medida legislativa que tanta emoção tem gerado entre os mais inquietos e descontentes com os rumos da governação, e não serão os “de” ou os “da” que farão a diferença. A imaginação é pródiga e os bois, como irão ver, hão de mesmo chamar-se pelos nomes.   

João Frada
Professor Universitário


Portugal e a Crise: reflexões, respostas e medidas

Apostou-se em estádios de futebol e a maioria “está às moscas” todo o ano, mas ponderar em valorizar os nossos recursos, isso, ou é condicionado por quotas europeias, levando à “mumificação” destes sectores, ou é relegado, pura e simplesmente, a uma prioridade secundaríssima no contexto das preocupações de governação central e autárquica. Estabelecem-se tantas parcerias público-privadas e algumas têm sido um desastre para as finanças públicas. Todavia, estas “parcerias estratégicas”, se implementadas com o maior sentido de racionalidade, seriedade e ponderação ao serviço de novos projectos viáveis e sustentáveis, podem vir a tornar-se rápidos motores de emprego, de desenvolvimento e de riqueza. O tempo urge e as nossas tremendas “obrigações de dívida” não perdoam. O mar, a todos os níveis, é um dos nossos maiores bens. Desde recursos alimentares, a energia limpa, se a soubermos explorar (e há já tecnologia para o efeito), a lazer, podemos encontrar nesta vertente uma quase inesgotável fonte de receita e de saúde. É espantoso como um país com mais de 800 Kms de costa, sem contar com Mediterrâneo e Ilhas, com sol quase todo o ano e um clima dos mais amenos da Europa, não dispõe de mais de meia dúzia de talassocentros e alguns deles apenas de acesso restrito! Oferecendo talassoterapia (sol, água do mar, areia marinha, algas) todo o ano, boa gastronomia e hotelaria, lazer e saúde, criavam-se empregos, atraíam-se turistas e dinamizava-se, deste modo, um importante sector da nossa economia que, por ora, se mantém praticamente inexplorado. Esta modalidade terapêutica, tal como a termalismo-terapia, é uma das melhores alternativas para a correcção ou cura de patologias osteoarticulares, agudas ou crónicas, e poderia vir também a representar uma aposta inteligente e de grande eficácia no domínio da Saúde Pública em Portugal. Se é possível estabelecer convénios com centros termais, porque não com talassocentros, caso eles existam e ofereçam as condições convenientes de utilização?! Explorando inteligentemente os nossos recursos e capacidades, estes ou outros que garantam viabilidade e rendibilidade económicas imediatas, talvez então possamos vislumbrar alguma luz ao fundo do túnel. Ou se fazem investimentos e se gera riqueza familiar através do emprego, ou venham “os milhões” que vierem, não viremos a ter quaisquer hipóteses de sobrevivência económica e financeira. Seremos, pura e simplesmente, engolidos pelo Grande Capital Estrangeiro que, a pouco e pouco, nos atirará para a pobreza generalizada, tomando conta e anexando todos os nossos sectores estratégicos e produtivos. Não é com uma contínua e crescente sangria fiscal, altamente lesiva da capacidade de sobrevivência e investimento de famílias e empresas, que a Economia Portuguesa se conseguirá endireitar. Esta fonte, Senhores Governantes, já tem um lençol freático muito exaurido. 

João Frada 
Professor Universitário
Lisboa, 01.07.13

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Economia Paralela

“Economia paralela subiu para 26,7% do PIB e representa mais de metade do empréstimo da troika
Em valor absoluto, a economia não registada ascendeu a 44.283 milhões de euros em 2012.”

Mais de 44 mil milhões de euros que escapam ao Fisco em Portugal.
Já por mais de uma vez nos debruçámos sobre esta questão. É prática corrente no país a fuga ao Fisco, todos o afirmam, e sempre foi assim. Agora, é mais visível porque os mecanismos fiscais também se tornaram mais atentos…não mais eficazes. E a noção que se vai tendo desta prática viciosa, observável a todos os níveis da sociedade portuguesa, porque a comunicação social nada ou muito pouco deixa passar em branco, é exatamente esta: a economia paralela movimenta somas espantosas que não beneficiam nem o Estado, nem aqueles que fazem parte do sistema, os quais não só não tem a mínima chance de fugir ao fisco, ainda que lhes passe pela cabeça tal ousadia, como jamais verão os seus esforços tributários diminuídos, bem pelo contrário, vão definhando dia a dia, constantemente sangrados pela máquina fiscal, também ela em risco de colapsar, face a uma despesa pública incontrolável e a um subsequente aumento de défice, perante uma dívida externa colossal que, em empréstimos e juros, se revela imparável e a uma produtividade que não chega, nem de longe, para gerar um superavit positivo, capaz de reequilibrar esta balança desengonçada que a passos largos nos remete para outro resgate ou para uma total bancarrota, sem retorno. A décalage entre o que entra em termos de receita, por exportações, turismo e pouco mais, e o que devemos é de tal ordem que se torna impraticável qualquer pagamento de dívida, seja qual for a taxa de juro a que possamos ter acesso. Este é o saldo negativo de várias décadas de democracia. As leis que poderiam conduzir a uma melhor gestão dos nossos recursos, os mecanismos tributários implementados e a visão dos nossos governantes têm enfermado, todos eles, de uma miopia política espantosa. 
Repare-se: 
Subiu-se o IVA, estoirou-se com a restauração, pelo menor consumo e subsequente desemprego, com menor dinâmica interna comercial e industrial, com milhares de micro, pequenas e médias empresas colapsadas, com mais desemprego e menos receita de IRC. 
As regras tributárias e consequentemente o esforço fiscal que se pede a estas empresas nacionais de pequena dimensão, que dinamizavam a economia interna e criavam emprego, não são os mesmos que se exigem às grandes empresas, muitas das quais estão sediadas noutros países, onde as condições fiscais lhes são mais favoráveis.    
Cada cidadão, ao longo de uma vida, pelo menos o que não está pendurado em subsídios ou em artimanhas, não comprou ações do BPN, que reconvertidas a tempo, lhe dariam, como a outros, uma boa maquia de euros, não teve a sorte de acertar no euro-milhões nem recebeu nenhuma herança de uma tia falecida nos “States”, no Canadá ou no Brasil, e tem que “dobrar a mola” para forrar alguma coisa para a velhice, já que sabe de antemão que não será a Segurança Social que o irá livrar da fome e da miséria, só pode mesmo contar consigo próprio. E tudo quanto poupou e tudo quanto resultou de um sacrifício imenso pleno de opções, nem sempre as mais agradáveis ou convenientes, não conta minimamente para lhe aliviar a carga fiscal. Do que gastou em comida, em bebida, em vestuário, na renda de casa ou no empréstimo bancário por ser casa própria, na manutenção e reparações da habitação, em transportes, em saúde, em formação, nos momentos lúdicos a que também tem direito, na higiene, na saúde, na alimentação, incluindo o aleitamento dos seus filhos, muito pouco ou nada entrou em linha de conta fiscal. O Estado apenas pretende que pague a tempo e horas os pesados encargos tributários, sob pena de arrestar tudo o que tem e não tem, incluindo a habitação que não é sua, porque está hipotecada e, face às magras receitas nem sempre garantidas, pode ir parar às mãos do banco por incapacidade de cumprimento. E se em todas as despesas que não entram nessa contabilidade fiscal, tiver que acrescentar 23% de IVA, o indivíduo, pensa duas vezes. Mas, admitindo que não prescinde, civicamente, de exigir faturação de tudo quanto paga, ainda que ela não lhe sirva para nada ou pouco valha em termos de benesse fiscal, se resolver apresentar ao contabilista um maço imenso de papéis ao fim do ano, seguramente, irá pagar honorários mais altos ao seu técnico de contas, sem grande benefícios. O que possa poupar em IVA, sempre que a sua opção o beneficia a si, enquanto pagador, e a quem recebe, enquanto recetor do pagamento, é de longe mais compensador do que a miserável benesse fiscal oferecida pelas Finanças. E sempre que pode não paga, e foge ao fisco e aumenta cada vez mais a Economia Paralela. De resto, os exemplos vindos de cima têm-se somado às dezenas. Alguém ainda se lembra da que ficou batizada como “Lei Cadilhe”?! Apostaria que muitos já não se lembram e outros tantos nem deram por ela. Então, só terão de fazer uma simples pesquisa e verão que estes males já vêm de longe e bem de cima. 
Qualquer merceeiro saberia como evitar este cancro das finanças públicas, enquadrando tudo quanto se recebe e tudo quanto se gasta na contabilidade fiscal de cada ano e premiar, significativamente, quem adere e faz cumprir o que a lei prevê, contribuindo para a diminuição da evasão fiscal. Mas os nossos experts de finanças tardam a descobrir este “remédio” ou outra medida que quebre este ciclo vicioso. Andarão os nossos governantes distraídos ou serão de tal ordem destituídos e incompetentes que não atinam com o óbvio?  
             
João Frada
Professor Universitário