quinta-feira, 22 de junho de 2017

INCÊNDIOS e PUNIÇÕES

Quando os incêndios resultam de intervenção dolosa humana, piromaníaca, sádica e cruel, as respostas da Justiça nem sempre são, nem têm sido, as mais dissuasoras e educativas. Sou do tempo em que sentir a Pátria não era nem foi, apenas, emocionarmo-nos ao ouvir o nosso Hino, vestir a farda da mocidade portuguesa ou, mais tarde, defender o território nacional, de G3 na mão. Formatavam-nos, mal ou bem, para reagir com dureza e agir, sem dó nem piedade, contra quem pusesse em causa os valores da Pátria, a integridade e o património nacionais. Pelos vistos não era crime defender a todo o custo o país e os seus bens, fossem eles continentais ou coloniais. O Mundo mudou, entretanto, a democracia tende, agora, a marcar os ritmos de vida, do pensamento e da sociedade dos nossos dias e é o espírito humanista de tolerância e de perdão que passa também a ser o “fiel” da balança da Justiça, na opinião de muita gente, desequilibrado e a necessitar de aferição urgente. Incendiar, arrasar, destruir e pôr em causa a vida de seres humanos e animais passam a ser uma prática comum todos os verões. E a Justiça continua a pautar-se pela brandura e por um espírito penal generoso e humanista: - prisão preventiva no domicílio, que sai mais barata aos cofres de Estado, aplicada aos que não conseguem demonstrar a sua inimputabilidade, e liberdade condicional a muitos outros, que sofrem de piromania mórbido-recorrente e acabam por voltar a cometer os mesmos atropelos. Já, em tempos, João Cravinho terá exaltado essa característica tão fundamental das “nossas leis”: "temos o Código Penal mais humanista da Europa". Que maravilha de sociedade, tão compreensiva e voltada à psicanálise e ao tratamento da piromania compulsiva, seja ela dissimulada / fraudulenta ou não! Para além disso, tanto quanto se sabe, o código penal português, bem mais evoluído do que os demais europeus e do resto do mundo, também não prevê que um tarado piromaníaco, indiscutível e comprovadamente, homicida e patrimonicida...apanhado com as "patas no fogo", receba uma punição exemplar, nem, tão pouco, seja obrigado a trabalhar. De resto, se a avaliação psicológica ou psiquiátrica garantir que o indivíduo é inimputável, ficará, quando muito, sob vigilância policial e tratamento médico, em prisão preventiva ou efectiva, mas não mais do que isso. Segundo estatísticas, apenas 20% dos presos portugueses aderem, voluntariamente, a atividades ocupacionais, visando a reeducação e reinserção social. Pouco, muito pouco! Os restantes 80%, mantêm-se de "férias forçadas", numa "boa". Por tudo isso, não nos pareceria inapropriada, nem demasiado pesada a aplicação de penas cívicas a indivíduos comprovadamente “incendiários”, obrigando-os, incondicionalmente, a trabalhar na abertura de aceiros, limpeza de matas, estradas, caminhos e bermas, plantio e reflorestação, já que, sem sombra de dúvida, sentem uma atração irresistível, ainda que mórbida, pela Natureza. Seria, talvez, uma forma psicoterapêutica de se reencontrarem, não com a Natureza morta que tanto apreciam, mas com o ambiente vivo da floresta, árvores, plantas, flores e animais, e descobrirem o respeito que não têm, nem nunca tiveram por esse mundo tão frágil e desprotegido. Mantê-los com pulseira electrónica no domicílio, babando-se orgasmicamente frente ao ecrã de televisão, todos os verões, enquanto desfrutam as inevitáveis notícias escaldantes dos fogos e incêndios que lavram nas nossas florestas, isso não, senhores juízes! Fazer justiça, assim, não passa de uma utopia! Segundo estatísticas de 2016, mais de 75% dos incêndios que ocorrem em Portugal terão tido “mão humana” implicada, direta ou indiretamente, agindo por “de motu próprio” ou a mando ou interesse de outrem. Recebendo uma justa punição, sem tolerância, apelo nem agravo, estes criminosos, doentes psiquiátricos ou não, deveriam então redimir, obrigatoriamente, sob vigilância policial ou do exército, os seus pecados, as suas faltas, os seus atos criminosos, cumprindo tarefas de limpeza de matos, bosques e áreas florestais (que ainda, felizmente, sobrevivem por esse país fora), durante os meses frios do ano. Quando tantos cidadãos com deficiências participam e trabalham com esforço e sacrifício, ultrapassando com denodo as suas limitações diárias, quando tantos doentes lutam pela sua sobrevivência e não param de cumprir as suas obrigações profissionais, quando tantos idosos labutam na terra e de enxada na mão, de sol a sol, será que ainda há alguém capaz de advogar que um tarado destes, piromaníaco insensível e quantas vezes recorrente, não deva receber um castigo exemplar, cumprindo, voluntariamente ou não, trabalhos de protecção, preservação e recuperação da floresta?! Será que um serviço cívico desta natureza, enquanto punição de cumprimento obrigatório, atenta contra a dignidade humana destes presos ou choca, eventualmente, com o elevado espírito humanista do nosso ou de outro qualquer código penal?! Não nos parece. E julgamos que constituiria uma excelente e inovadora alternativa à pena de prisão efetiva, com enorme peso reeducativo, dissuasor e terapêutico, levando o preso “incendiário” a ponderar naquilo que destruiu e a ligar-se àquilo que passa a preservar e a criar. Entendemos que esta forma de punição, a qual, na nossa opinião, nunca terá sido aplicada em nenhum julgamento ocorrido em tribunais portugueses, nem tão pouco discutida enquanto proposta parlamentar ou sugestão governamental, poderia vir a ser uma extraordinária medida jurídico-penal, de reflexos reeducativos e socio-inclusivos e, acima de tudo, um “ponto” favorável à subida de “rating” na atual escala de (des)crédito da população em relação à brandura do sistema judicial e ao amorfismo dos políticos e da governação, perante o crónico problema dos incêndios e dos incendiários. De igual modo, acalmaria também os ânimos das populações, revoltadas e desiludidas, minimizando-se o risco de radicalismos, sempre indissociáveis do sentido e dos atos de justiça popular................................................................................................................... Fontes: - Estatísticas negras dos fogos em Portugal… https://www.sapo.pt/noticias/economia/estatisticas-negras-dos-fogos-em-portugal_59467ba3e0aeff873df429aa - Detidos [em 2016] mais incendiários do que em 2015. Menos de metade, ficam presos. https://www.sapo.pt/noticias/economia/estatisticas-negras-dos-fogos-em-portugal_59467ba3e0aeff873df429aa................................................................................................. João Frada Calendas Semânticas, 2000