Diálogo sobre Filosofia
Barata
- O que dizer sobre o que nada
contém para dizer?! – pergunto… e tu respondes:
- Há sempre qualquer coisa
para dizer, ainda que seja, apenas, que nada há para dizer.
Há sempre, então, um “quase
nada”, mas não um “absolutamente nada”, para dizer.
- Filosofias! És fértil até em
ideias que nada contêm de ideias. E sei que nada dizes, embora apregoando que
dizes realmente muita coisa. É uma forma subtil de nada dizeres, a quem te
esteja a ouvir.
- Tens razão. Falando, ainda
que nada digas, agradas a quem te ouvir e o teu ouvinte, pelo menos, enquanto
se ocupa a decifrar o que nada existe na informação vazia que emitiste, julga
ter ouvido alguma coisa e ocupa a mente, convicto de que, se nada entende ou
compreende, não é porque nada disseste, mas porque não soube escolher ou aplicar
o método hermenêutico e neuronial
adequado à inteligibilidade do que ouviu.
- Há muitos que nada dizem quando dizem alguma coisa e ainda que, uma ou outra vez, possam
deixar escapar algo palpável e real quando se fazem ouvir, são capazes de se
desdizer no momento seguinte, não sustentando nenhuma afirmação e reduzindo a
zero tudo quanto acabaram de dizer.
- É o que mais se ouve, por
aí. Quem diga e desdiga tudo quanto diz. Grandes mestres na arte de nada dizer,
dizendo tudo sem dizer nada. E o mais grave disto tudo, é que muitos acreditam
no que ouvem e julgam ter ouvido, tomando como realidade o que não passa de
ficção, não conseguindo discernir que nada do que foi dito significa verdade ou
inverdade e não passa de um mero eco de coisa nenhuma.
- Não há só quem nada diga,
afirmando dizer tudo, também os há que nada dizem por nada saberem dizer, mas
encostam-se a quem diga por eles e passam, assim, despercebidos no meio da
manada que nada diz, nada tem para dizer, nunca disse nada e, quando descobre
que pode dizer alguma coisa, fica calada, em estado de total mutismo e de bovina solidariedade
clânica.
- Finalmente, depois de me
ouvires, dizendo tudo sem nada dizer, ainda achas que me ouviste dizer alguma
coisa?!
- Oh, se ouvi! Disseste muita
coisa nas entrelinhas desta conversa silenciosa.
- Ainda bem, então, que entendeste
o meu recado. Julguei ter falado, sem nada ter dito, mas, afinal, sempre sobrou alguma coisa deste diálogo, singularmente, surreal: a convicção de que se pode dizer tudo sem dizer nada.
Moral da história:
Moral da história:
“Sortudos, aqueles que, mesmo
calados, encontram sempre alguém que os saiba ouvir.”
Calendas Filosóficas, 2000
João Frada