Estou contente
Por saber que não vivo uma ficção ou utopia.
Por me sentir um cidadão fundamental,
aqui gerado e crescido de raiz.
Por poder gritar, em Portugal,
medrado em saudade e maresia:
– Tenho a Europa a meus pés e aqui à mão.
– Sou pobrezinho mas senhor do meu nariz.
Estou contente
Por ver a transparência dos meus príncipes,
imbuídos de altruísmo e sentimentos,
reluzentes de franqueza e honestidade,
declarando os seus parcos rendimentos
como qualquer cidadão, vulgar mortal,
pedagogo, poeta e dramaturgo.
Por constatar que também sofrem de saudade
quando regressam, de vez, à capital,
cansados da fartura de Estrasburgo.
Estou contente
Por ver que prevalece a rectidão,
entre todas as normas de conduta,
e os braços da justiça são adagas
que não concedem amnistia nem perdão
aos vermes roedores, «bichos-da-fruta»,
que nos assolam a vida como pragas.
Estou contente
Por ver no meu país desconhecido,
rasgado pelos dinheiros estruturais,
estradas e pontes sem curvas e sem bossas.
Embora haja sempre alguém desiludido,
amante das paisagens naturais,
saudoso de ver burros e carroças.
Estou contente
Por poder abrir a boca, finalmente,
gritando em liberdade, com justiça:
– Tenho um rei e um ministro geniais.
Estou contente
Por ser súbdito deste reino diferente,
talhado em vinho fino e em cortiça,
predestinado a altos ideais.
Estou contente!
João Frada, Olhos nos Olhos da Alma, Edições CLINFONTUR