A polícia, o exército, os militares da GNR ou qualquer outra força da ordem, a partir de agora, quando confrontados com uma situação idêntica a esta, a dos ciganos, alegadamente gatunos em fuga com armas, bagagens e toda a família atrás, novos, velhos e crianças, … praxe corrente… a que se poderão juntar cães, éguas, mulas e cavalos, como é óbvio, terão primeiro de proceder ao levantamento fotográfico através de infravermelhos, por satélite ou outro meio de identificação preciso, que não colida com a privacidade ou os direitos humanos, e só depois deverão apontar os canhangulos para os alvos a abater, excluindo, à partida, velhos, mulheres, crianças e, naturalmente, um ou outro distinto representante da raça cavalar. Há que contar com a atenta e ativa intervenção dos organismos e associações de proteção da mulher, dos velhos, das crianças e dos animais. Ninguém deve dar-se ao luxo de andar por aí a disparar ao Deus dará, ainda que julgue ser essa a única saída para pôr termo a um assalto. E, desta vez, um menino, adolescente, aprendiz ou não da velha “Arte de Furtar”, colocado tragicamente no local e na hora errados, numa carrinha (camionete) usada para um assalto, servindo, supomos, involuntariamente de escudo à família, foi baleado e faleceu. Lamentável, esta ocorrência.
O pobre do militar da GNR, não dispondo de leitor de infravermelhos, a fim de flashar quantos e quais seriam os ocupantes da viatura em fuga, coagido pela força do dever na sua arriscada missão diária de controlo e de manutenção da segurança pública, depois de uns tiros de aviso para o ar, que na confusão da fuga em alta velocidade e de janelas fechadas nem se teriam seguramente ouvido, faz aquilo que as normas de manutenção da ordem pública determinam: alveja a viatura dos assaltantes. Azar. O mais inocente da família de assaltantes paga com a vida as “borradas” dos adultos.
Moral da história, na perspetiva do/a inteligente magistrado/a que julgou o caso:
- Os larápios, ao transportarem uma criança de onze anos durante o assalto, eles próprios, estavam a colocar em risco a vida da mesma, o que viria a acontecer. Insensatos e imprudentes não foram responsabilizados, que se saiba, como agentes deste homicídio involuntário. Apenas um lapso judicial…
- Provavelmente, apesar dos sinais exteriores de riqueza da família atingida pela morte tão funesta desta criança, ninguém irá indemnizar o Estado português pelos prejuízos e custos com a manutenção da lei e da ordem, nem arcará com o respectivo pagamento das custas de justiça. Será, uma vez mais, o Zé Povo, incluindo os lesados do roubo e, claro, o azarento militar da GNR a suportar com os seus impostos tais despesas judiciais, bem como a compensar, monetariamente, a família da vítima.
Como corolário de tudo isto, um vez que o crime compensa e os exemplos desta realidade em Portugal “são mais que muitos”, somos levados a acreditar que, a partir de agora, depois de uma decisão judicial tão inteligente como a que acabámos de assistir, qualquer meliante, decidido a assaltar um banco, uma casa ou uma repartição de Finanças no fim do mês ou na época adequada de receção do IRS ou IRC, …porque não?!..., levando crianças às costas, ao colo ou a tiracolo, pela mão ou pela trela, sempre tem mais possibilidades de escapar a qualquer tiroteio imprevisto levado a cabo pelos “ceguinhos” dos GNR, os quais, visivelmente, apesar do treino periódico, não atingem gente grande e, vai-se lá saber porquê, só acertam em alvos pequenos. E até se sinalizar, prévia e devidamente, a viatura de fuga, postando uma boa foto ou um autocolante com boas dimensões aludindo à presença de bebé a bordo, fazendo bluff ou não (usando mesmo uma criança como escudo protetor, como foi o caso), quem sabe se não virá a ter maior possibilidade de êxito, dissuadindo as forças de segurança e evitando que elas ponham termo a estas tropelias de uma maneira tão radical e desumana. O crime, bem urdido, parece compensar.
João Frada
Professor Universitário
POA, 09.11.13