sábado, 19 de outubro de 2013

Confusões Semânticas

Miguel Sousa Tavares, seguramente, cauteloso e ciente de que as suas afirmações lhe poderiam trazer algumas inconveniências, sendo ele quem é e assumindo que Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, não lhe merece, nem tem merecido, nem virá sequer a merecer consideração alguma,... e ele lá terá as suas razões, de resto, idênticas ou não, às de outros milhões de portugueses que não se manifestam acerca do perfil da nossa mais alta eminente figura institucional nem são tão visíveis como o Miguel S. Tavares, embora a muitos, estamos certos, não lhes falte igual vontade de clamarem o que lhes vai na alma…, fez o que pensou ser mais adequado: retratou-se. Afinal, esta consideração metafórica dita na hora e no local errados, diz-nos Miguel Sousa Tavares, foi mais um “deslize” instintivamente pronunciado porque o senhor Professor Doutor Cavaco Silva não faz realmente o seu género de figura política. Sousa Tavares, como qualquer ser humano, tem todo o direito de escolher os seus ídolos, de fazer as suas opções e o Professor Cavaco Silva, pelos vistos, não preenche os seus requisitos exigentes de “excelso animal político”. Éramos capazes de apostar que, para o Miguel S. Tavares, teria de ser um animal racional, inteligente, culto, certamente mais sisudo, dotado de uma boa armadura retórico-dialética de índole positivista, pragmática e laica, entre outras qualidades. A verdade é que o senhor Presidente, contrariamente ao  Miguel S. Tavares, não é um literato no sentido real do termo, um intelectual, como o Miguel desejaria que fosse,    acredita piamente na N. Sra. de Fátima e na sua divina intercessão para nos tirar da crise, é um homem de discurso simples e ecuménico, como convém a um presidente, de bom caráter, bem disposto, dá um pezinho de dança quando o convidam durante uma ou outra inauguração nas suas frequentes digressões regionais, diz umas piadas animadoras, queixa-se das mesmas amarguras que flagelam o povo (referindo que o baixíssimo fundo de pensões do banco de Portugal e da Caixa Geral de Aposentações, que se supõe rondar apenas os 12.000 euros por mês, mal cobre as suas despesas), a ver se a malta mais desmilinguida pela austeridade, pelas crescentes dificuldades e pelo desemprego, não o apupa nem vaia demais, vai semeando esperança, fazendo de conta que tudo está mais ou menos bem, que o país caminha a passos lentos mas firmes para a recuperação, que estamos, não tarda, quase livres da malfadada TROIKA, convocando o Conselho de Estado para discutir o que, está à vista de toda a gente, a eminente saída desta “gente troikiana” (como diz o Paulo Portas) e a urgente e atempada definição estratégica do pós-troika para, enfim, podermos assistir a uma entrada triunfal do país em algo que se aproxime a um Oásis, parecido com aquele de que falava o ex-PM. Lembram-se?! Apenas fica um pouco mais tenso e reativo quando os chatos da comunicação social exageram ou o Alberto João Jardim o trata por senhor Silva. É um homem esperançoso, que pretende com a sua ação presidencial transmitir alegria, boa disposição e esperança no futuro a todos os portugueses. É visível todos os dias o seu esforço. Miguel Sousa Tavares, se atentasse bem, inteligente e culto como é, perceberia de imediato que escolheu mal o adjetivo, se a intenção era desprestigiar o PR, porque ser “palhaço” não é uma indignidade. Pelo contrário, o verdadeiro palhaço é uma figura grata capaz de transmitir ou até imitar na perfeição tudo aquilo que um Político, na concepção de muita gente, pode representar, uma série de facetas, incluindo a esperança, a fé e a utopia. E sem estas, o mundo não avança. Dito isto, e não pretendendo ser advogado de ninguém, porque para tal não temos nem formação nem procuração, mas colocando-nos mais na posição de psicoanalista, somos levados a crer que o adjetivo de “palhaço”, neste caso particular, referido por Miguel S. Tavares, deveria era ser encarado com uma distinção e não como um insulto, ainda que não fosse essa a intenção de Miguel S. Tavares…como ele assumiu. Porque afinal, à passagem e presença do PR em diversos locais e ocasiões, dada a situação tão emotiva que o país vive, já ouvimos, vimos e lemos na comunicação social televisiva e não televisiva considerações e adjetivos bem mais incómodos e, porventura, mais insultuosos. O conceito de palhaço, tantas vezes usado com sentido pejorativo, lamentavelmente, acaba por conduzir a estes exageros de interpretação e eis que o próprio PR se sentiu atingido na sua dignidade pessoal. E apresentou queixa ao MP, o mesmo que parece ter tido “ouvidos moucos”, como afirma José Sócrates, em relação a idênticas situações ocorridas anteriormente, visando outras figuras de Estado. Ao MP caberá pronunciar-se sobre este opróbio. Mas Sua Excelência, o senhor PR saberá, melhor do que ninguém, quem é e quem não é. E muitos já perguntam: será que não está a dar demasiada importância a quem não deve e ao que não deve? Lembremo-nos, por exemplo, dos simpáticos palhaços que espalham alegria, boa disposição, diversão, comicidade, ânimo e esperança, não apenas no circo, mas nas enfermarias dos hospitais, a quem sobrevive à doença, a quem está profundamente debilitado, fragilizado e deprimido…e precisa de sorrir e acreditar que há futuro. Ora, atente-se nas semelhanças e digam lá se deve ser considerado insulto! Achamos que tudo não passou de um comentário impremeditado, de uma verdadeira confusão semântica, e o Miguel S. Tavares, arguto como é, apenas não conseguiu, desta vez, analisar esta tão simples questão. Apelando ao espírito magnânimo e ao sentido de humor de Sua Excelência o PR, apetece-nos gritar bem alto: vivam os palhaços e as palhaçadas se forem para nos fazerem mais felizes. Os portugueses precisam de sorrir. Não dimensionemos o que não tem dimensão.    

João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 27.05.13 (comentário atualizado)


OS NOSSOS CAUDILHOS

Ouvimos há dois dias na TV Constança Cunha e Sá, de língua afiada, mas bem orientada e acutilante, cortar a torto e a direito, ao centro e à direita, e um pouco mais moderadamente à esquerda, contudo, com a mesma precisão cirúrgica. Gostámos de a ouvir. Não poupa adjetivos a quem quer que seja. 
Falou sobre o PM e sobre todos os seus admiráveis companheiros, gente de discurso elegante que vai papagueando com grande convicção o que o seu mestre ordena, apregoando o êxito de uma governação que, tendo recebido uma herança socialista pesada, mudou o rumo da navegação e acredita, finalmente, ter produzido aqui, neste jardim à beira mar plantado, o oásis em que Sócrates acreditava. Acrobaticamente, com um desgaste físico e mental tremendo, fazendo horas extraordinárias, aos sábados, domingos, feriados e dias santos…já em menor número…o nosso esforçado PM, nunca tendo trabalhado tanto na vida, nem enquanto prestava serviços dedicados aos seus grandes amigos Ângelo Correia e “Dr. Relvas” (absorvido também aqui na sua admirável campanha de formação aeroportuária garantida pela Tecnoforma), conseguiu o impossível: paradoxalmente, baixou a receita fiscal, apesar do agravamento tributário, baixou o desemprego, nomeadamente o dos boys ligados ao PSD, baixou as dívidas de centenas de amigalhaços a quem garantiu excelentes empregos, bem remunerados e compensados ainda com uns cartões de crédito para compras, viagens e refeições, sobretudo daqueles que, apesar de poderem gastar à tripa forra e terem ainda direito a subvenções ou subsídios de férias e de Natal, conseguem fazer umas boas poupanças com esta “sorte grande” que lhes saiu, conseguiu harmonizar os vencimentos entre o público e o privado, mesmo sabendo que o público lhe assegurou, por imposição obrigatória, duas bolsas gigantescas do Fundo de Pensões da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, hoje quase esgotadas pelas distrações dos sucessivos governos, incluindo o seu, minimizou os gastos com a saúde, poupando milhões de euros, claro está, não comparticipando a maior parte dos medicamentos e aumentando brutalmente as taxas moderadoras, contribuiu, com grande esmero, tal como os anteriores governos, diga-se de passagem, para a redução drástica de gastos com a educação, pondo milhares de professores na rua e alienando dezenas de escolas, já que, sem meninos, estavam às moscas. Mas fez mais: chutando para a emigração milhares largos de jovens, gente em idade de poder fazer meninos, e não apoiando nem alimentação, nem artigos de higiene, nem vacinas, nem vitaminas, nem a maior dos fármacos prescritos pela Pediatria à cachopada que ainda vai nascendo por aqui e por acolá e, a par dos pais desempregados e sem casa, vive em casa dos avós, estes, coitados, a braços com duras dificuldades pela redução dos “elevados” ordenados e pensões que, ele, o PM insiste em arrasar em 2014 um pouco mais para poder garantir emprego aos seus fiéis boys, muitos deles super-especialistas nas mais diversas áreas académicas e científicas, rapazes e raparigas entre os 23 e os 30 anos, por todas estas intervenções governativas excecionalmente brilhantes, direi mesmo inteligentes, o nosso ilustre PM e todo o seu séquito têm contribuído com grande sabedoria para o controlo demográfico e, visivelmente, para o equilíbrio das finanças públicas. O exemplo mais acabado é mesmo este, o da demografia: menos acesso a cuidados de saúde e a farmácias, morre-se mais e dura-se menos, menor natalidade, menos gente a mamar subsídios, menos hospitais, menos escolas, logo, menos encargos com a assistência médica, com docentes e com educação, na verdade, os dois grandes algozes das finanças de qualquer governo. Tem sido uma ginástica notável, esta governação, lamentavelmente, pouco solucionadora das dificuldades sentidas pela grande maioria dos portugueses e cada vez mais errática e gravosa…, como diz a Constança Cunha e Sá. Se houvesse Olimpíadas de Governos Incapazes, seríamos seguramente sérios candidatos ao primeiro lugar!
Constança Cunha e Sá analisou também, sem grandes rodeios, o papel do PR: uma espantosa figura, dizia ela, que chefia fielmente e com coerência partidária o clã governamental, ou não seja ele também um venerável membro do partido. Mas surgem mais sinais de descontentamento da cidadania. Mário Soares acusa-o, tal como Constança Cunha e Sá, de desonestidade ou incoerência política, pela sua incapacidade de assumir a ligação privilegiada ao BPN. Estranhamente, Cavaco Silva assume-se como um simples depositante do BPN e não como um convidado privilegiado que foi, já que o acesso àquela instituição bancária não era para toda a gente e muito menos a compra de ações. Depois, a diferença entre o preço de compra e de venda foi de tal ordem que o banco, com negócios destes, perdendo um valor astronómico na transação, só mesmo por especial razão poderia ter efetuado este negócio. E qual seria?! Toda a gente gostaria de saber. Até nós.
Estranha compra (oferta?) de ações BPN à SLN e a Oliveira Costa (BPN), diz Soares, insistindo que Cavaco Silva venha a público explicar, de uma vez por todas, o inexplicável. E a única resposta de Cavaco Silva que se ouve e nada esclarece sobre a questão é esta: “ainda está para nascer quem seja mais honesto que eu”. Aguardemos, então, por esse utópico nascimento tão dotado e genial, não obstante a quebra de natalidade que se aponta, fragilizada por tantas dificuldades económicas e precaridade alimentar, e esperemos por um cruzamento de gâmetas tão privilegiado como o que terá ocorrido, in illo tempore, lá para os lados do Algarve!
Miguel Sousa Tavares batizou, quanto a nós, erradamente, o PR de palhaço e teve de se retratar. Esta grata figura de circo, palhaço, considerando o conceito integrado num espaço de entretenimento e não na arena política, de um modo geral, reúne uma enorme diversidade de atributos, patentes nas piruetas, nas cambalhotas, nas falsas magias que divertem a quem o vê, nas cançonetas que interpreta afinando ou desafinando, nas improvisadas macacadas cheias de graça e boa disposição, nas capacidades acrobáticas que tantas vezes lhe são peculiares. Claramente, Miguel Sousa Tavares não escolheu bem o dito adjetivo. Cavaco Silva não se identifica minimamente com esta figura, nem nas graçolas nem nas acrobacias. É um homem sério e de riso não fácil, de certo modo, até comedido. E, neste caso, do BPN e das ações a que Mário Soares, Constança e outros tantos analistas se referem, por mais “flexibilidade esquelética” que os seus argumentos possam ter, por mais contorcionismo que as suas razões possam intentar, vai ter uma enorme dificuldade em “descalçar a bota”.

João Frada
Professor Universitário