sábado, 13 de dezembro de 2014

PROTESTO

PROTESTAR

Protestar, bater o pé,
Lançar pedras e petardos,
Dar umas pauladas, até,
Mostrar cartazes, vaiar,
Soltar insultos sem rol,
Assobios, vuvuzelas…
São tristes gestos insanos,
Não passam de entusiasmos
De loucos do futebol.

Contra a miséria e a fome
Contesta-se sem emoção.
Contra taxas e impostos,
Reformas e desemprego, 
Gritam uns e outros não.

Arrancam-nos tudo, o sossego,
A pele, a boca e os dentes.  
Governantes salafrários!…
Gritam alguns descontentes…

Logo surgem uns idealistas
Pacíficos como bovinos, 
Sem saber que são otários,
Espalhando versos divinos:
Tenhamos dó desta gente,
Não sejamos pessimistas,
Radicais, contestatários,
Ponhamos já um travão
Nestas críticas sem rumo.
Temos de ser bem-dispostos 
Altruístas, solidários,
Moderemos a paixão,
Tratemo-los com aprumo.

Cidadãos e governantes,
Com insónias e enfados,
Combinam greves de zelo
aos domingos e feriados.
Assim, não há atropelo
nem transportes  bloqueados
ou situações aberrantes,
e, sem qualquer pesadelo,
tudo fica como dantes.

Somos bovinos, pacíficos,
Como alguém subentendeu
Numa certa ocasião…
Toleramos os corruptos,
no máximo do apogeu,
guardamo-los no coração.    
Mesmo com más criaturas,
Somos bons samaritanos
Contestamos ditaduras, 
Mas suportamos tiranos.

Amamos quem nos quer mal,
Quem nos suga e espolia,
Falsos profetas e nobres…
E achamos quase imoral
Dizer que em democracia
A justiça é desigual
Pra gajos ricos e pobres,
Ou que ela é dura e austera
Com quem trabalha e porfia
E branda com gente bera
Que nos rouba,  dia a dia. 

Na Grécia, de história heróica,
“Parte-se a louça” alemã
E “pontapeia-se”  a Troika
Não com pantufas de lã.
Na China saem à rua
E com firmeza pelejam,
Ninguém se cala ou recua,
Nem quando as armas trovejam.
Em Espanha, os descontentes
Embarcaram na loucura
E todos juntos, aos remos,
Num bote de combatentes
Acreditam  na aventura
De navegar no PODEMOS.

Nós, por cá, frouxos, amorfos,
Navegando neste charco
Vivemos indiferentes
Aos ditames da política
E ao rumo do nosso barco
Com as cores de Portugal.
Desde que haja bons garfos,
Facas, chouriços e dentes,
Punhetas de bacalhau
Um bom tinto, futebol
E boa cama à mercê,
Alguém quer saber da “nau”
Ou tecer alguma crítica?!
Protestar é surreal,
O que importa é ver TV,
sentir saudades num fado,
pedir perdão numa prece
e confiar no além…

Quem assim vive pautado
Merece a sorte que tem.