Teoricamente, optar-se apenas por uma única modalidade, a pública, bem dotada e à qual todos, sem isenção ou diferenças de tratamento, tivessem acesso, até faria todo o sentido. Por outro lado, os médicos que se forma(ra)m em universidades públicas deveriam tratar os cidadãos cujo esforço tributário contribuiu também para a sua formação com toda a cortesia e não com indiferença ou quaisquer laivos de xenofobia social, económica ou académica. Profissionais mal formados, no sentido pejorativo do termo, em qualquer área ou setor, sempre os houve e seguramente continuará a haver. Uma árvore, porém, não faz a floresta inteira. Quanto ao acesso a tudo quanto uma medicina de excelência pode oferecer, em todas as suas vertentes de atual oferta médico-cirúrgica, isso, também numa verdadeira sociedade democrática onde se pratique a equidade na redistribuição de riqueza, no acesso ao emprego, na justiça, na educação e, sobretudo, na saúde, deveria acontecer. Mas nem as sociedades são democráticas, no sentido pleno do termo, nem o dito acesso é igual para todos. A medicina e a saúde que ela pode propiciar, a par de uma boa qualidade de vida higiénica e alimentar, lamentavelmente e por múltiplas razões não acessíveis a toda a cidadania, podem e devem ser encaradas como bens de natureza pública e, como tal, deverão ser facultadas a qualquer cidadão, seja qual for a sua condição económica ou social. Deste modo, enquanto houver ricos e pobres, abastados e remediados, classes altamente privilegiadas e deserdados da sorte, castas alta e baixas, realidade tão comum na maior parte dos países, a medicina há de ser sempre diferente para uns e para outros. Só numa sociedade democrática utópica é que a saúde e a medicina poderiam ser iguais para todos, em termos de acesso a recursos humanos, técnicos e tecnológicos de natureza diagnóstica ou terapêutica, independentemente da raça, da condição social e económica ou do estatuto académico. Porém, onde existe tal sociedade? Quando muito, os praticantes da medicina pública, querendo aperfeiçoar-se e otimizar recursos, poderão exercer uma arte mais hipocrática, mais racional e humanista, disponibilizando a todos os seus utentes os melhores meios ao seu alcance.
Temos mesmo que conviver com a medicina pública e com a medicina privada. O dinheiro, quer queiramos quer não, traça grandes diferenças em termos de oferta e de procura. Os Estados e os seus gestores não vivem de utopias nem as alimentam.
João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 06.09.13
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