quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Oeiras, roubo mas faço

http://expresso.sapo.pt/oeiras-roubo-mas-faco=f833325

“NÃO RESISTO A TECER UM COMENTÁRIO TÃO LONGO COMO O QUE LI”
Começaria por dizer que não me identifico com as posturas, atitudes e doutrina política de Isaltino Morais. Também não aceitaria defender as suas causas, ainda que tivesse competência para tal. Dito isto, concordo em absoluto com a visão crítica do articulista. Limita-se a caracterizar de certa forma um determinado tipo de mentalidade política, presente nas massas sem grande consciência cívico-política e, encapotadamente, senão mesmo aplaudida às claras por muitos dos que nos governam ou já governaram. Contudo, ainda que quem tenha ganho as eleições em Oeiras se assuma como “Delfim” de Isaltino, a verdade é que ainda que possa vestir a mesma pele, esta não fará dele, necessariamente, o mesmo lobo. Terá que se acautelar. Quanto ao facto de, “em frente a um estabelecimento prisional, centenas de carros buzinam enquanto os seus condutores gritam o nome de um dos presidiários. Trata-se de um político local preso por corrupção, [Isaltino Morais]”. Bem, esta nota realista faz-me rir. E sabem porquê? Porque o povo, depois de tanto ser roubado e assistir ao roubo, confrontado e atento à cada vez maior variedade de ladrões que pululam alegremente, por todo o lado, uns, coitados que roubam para comer, outros que precisam de arranjar uns cobres para retornarem ao Brasil (ainda se lembram do assalto ao BES?), outros que desviam milhares de milhões da banca, esperando que alguém o Estado tape os buraco, outros ainda que descaradamente roubam, em nome de altos valores patrióticos, os velhos deste país,…e continuariam os exemplos, que são mais do que muitos…, assistindo às patéticas penas e punições aplicadas, inevitavelmente, acaba por considerar o roubo e a corrupção como um fenómeno quase natural. Ou não?
Em todo o caso, já que estamos voltados para este covil, o de Oeiras, convido-vos a espreitarem outros covis e a observarem bem outras matilhas. Ou julgam que só em Oeiras há bichos com tais hábitos, esses que Isaltino tinha e tem e que outros tantos que votaram na lista do seu Delfim também terão? Esta postura de roubar, mas dar alguma coisa em troca a outrem, ainda que não seja muito, é suficiente para aplacar iras e consolar consciências, incluindo a de quem rouba. Uma espécie de Robin Hood dos tempos modernos. Rouba-se a quem tem, como é óbvio, e dá-se algo ou finge-se que se dá a quem não tem. E porque o que conta é o que se tem e aquilo com que se fica, quando se vive no limiar da sobrevivência e da pobreza, os valores éticos, aqui, para a grande maioria não constituem nem padrão de orientação nem enchem barriga. Mas há outros ladrões não menos ardilosos e astutos: aqueles que dão agora e roubam amanhã. E são a maioria. O povo, sobre estes, costuma dizer: só dão um bife a quem lhes der um porco...situação que tem sido frequente estes últimos tempos em todo o país: mandam dar um bife, hesitantes, comedidos e arrependidos, e logo a seguir, em nome da solidariedade sabe-se lá de quem, manda-se o fiscal confiscar o porco inteiro. Há lá paciência para analisar questões de direitos ou privilégios com tanta ladroagem legalizada, legitimada ou não legalizada????!!! Uns e outros são moscas pousadas de aguilhões chupando, não em qualquer coisa mal cheirosa, fétida, missão que todos lhes desejaríamos, mas ferradas em nós, nos nossos bolsos, nas nossas famílias, nos nossos filhos e netos. E termino, aplaudindo, uma vez mais, o articulista em causa pela análise que nos tece sobre o pragmatismo pessoal subjacente, ou não, ao juízo que se faz sobre a questão do roubo e da corrupção, de acordo com os interesses pessoais de cada um e não com os universais valores ético-morais. Na verdade, não há quaisquer estatísticas, pelo menos que se saiba, para aferirmos se o que nos preocupa, a nós, ou àquela gente que aparentemente buzinou e louvou o presidiário Isaltino, se é o roubo ou serem roubados que condiciona ou não as suas manifestações de entusiasmo ou de protesto. Se fossemos a analisar essa questão, poderíamos deparar-nos com uma outra questão de foro pato-sociológico. Paradoxalmente, na sociedade política em que vivemos, mesmo aqueles governantes que roubam e deixam roubar, descaradamente, debaixo das suas barbas e sob a sua anuência (“tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica ao portão”), não se chamando Isaltinos, são aplaudidos, todos os dias, pelo mesmo povo que saqueiam sem dó nem piedade. Cómico, não acham?!
João Frada
Professor Universitário
Lisboa, 03.10.13

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