Transparência,
sensatez e rigor governativos: mais vale tarde, que nunca.
“O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho,
avisou hoje que apenas as instituições de investigação científica classificadas
como muito boas ou excelentes pela auditoria externa que está a ser realizada
vão ter financiamento. (…)
Recorremos a peritos internacionais (...)
para fazerem a avaliação externa das nossas instituições científicas e
decidimos que aquelas que não forem muito boas ou excelentes terão apenas apoio
para funcionamento e que só aquelas que forem muito boas ou excelentes terão
mesmo financiamento, afirmou Pedro Passos Coelho em Braga, para encerrar o
XXIII congresso da JSD. (…)
O líder do PSD, que garantiu que nenhuma
instituição está acima daquela auditoria, justificou a opção de financiar
apenas as melhores instituições com a necessidade de ter garantias que o
dinheiro disponível será utilizado para produzir a melhor investigação.
Estamos a conseguir encontrar forma de
aplicar melhor o nosso dinheiro, de avaliar melhor as instituições e não há
instituições que estejam acima da avaliação e todas tem que ser avaliadas,
sejam laboratórios do Estado, sejam centros de referência ligados às
universidades, sejam os que foram criados por outros Governos sem nunca sequer
terem sido avaliados por ninguém, disse Passos Coelho. O líder do Governo justificou
a opção de atribuir financiamento apenas às melhores instituições com a
necessidade de não desperdiçar recursos. Precisamos das melhores garantias que
o dinheiro que temos vai ser bem utilizado para produzir a melhor investigação
e esta deve ser realizada por aqueles que tem melhores condições para a
realizar, disse.
Passos apontou ainda um destino para a
investigação em Portugal. Essa investigação tem que estar ao serviço das
empresas, de Portugal, referiu”.
(http://expresso.sapo.pt/passos-lanca-aviso-a-investigacao-cientifica=f902615)
Transparência, sensatez e rigor governativos
na atribuição de financiamentos públicos a instituições com responsabilidade
científica, considerados e classificados os seus projetos, atividades,
competência e produtividade, por auditores internacionais isentos, como Bons ou
Excelentes: é esta a suprema e recente vontade manifestada pelo Sr. Primeiro
Ministro, dr. Passos Coelho. Apenas não esclareceu se esta medida se destina
somente a instituições com atividades e responsabilidades estritamente
científicas, ligadas ou não ao setor universitário, ou também a outras
instituições ou organizações financiadas pelo Estado e por fundos europeus,
como é caso de qualquer ONGD, cujo grau de ação e rentabilização de recursos
humanos e tecnológicos, de igual modo, deva ser considerado irrepreensível e,
porventura, classificado de Bom ou Excelente, tendo em conta os objetivos
atingidos durante a sua intervenção nos mais diversos setores da vida social.
“Em regra, as ONGD (organizações não
governamentais para o desenvolvimento) têm as seguintes áreas de intervenção:
ensino, educação e cultura; assistência científica e técnica; saúde, incluindo
assistência médica, medicamentosa e alimentar; emprego e formação profissional;
proteção e defesa do ambiente; integração social e comunitária; desenvolvimento
rural; reforço da sociedade civil, através do apoio a associações congéneres e
associações de base nos países em vias de desenvolvimento; educação para o
desenvolvimento, designadamente através da divulgação das realidades dos países
em vias de desenvolvimento junto da opinião pública.”
(http://www.instituto-camoes.pt/faqs/root/cooperacao/sociedade-civil/faqs)
Uma ONGD bem conhecida, denominada Centro
Português para a Cooperação (CPPC), da qual Passos Coelho se tornou consultor
em 2002 e administrador em 2006, tanto quanto se sabe, tinha por objeto o
“apoio direto e efetivo a programas e projetos em países em vias de
desenvolvimento através de ações para o desenvolvimento, assistência humanitária,
proteção dos direitos humanos e prestação de ajudas de emergência. Os três
únicos projetos promovidos pelo CPPC, que o jornal PÚBLICO conseguiu
identificar, foram desenvolvidos em Portugal entre 1997 e 2000 e [terão sido]
financiados em cerca de 137 mil euros pelo Fundo Social Europeu (FSE) e pela
Segurança Social. (…)
Onze fundadores do CPPC ouvidos pelo PÚBLICO,
incluindo Passos Coelho, afirmaram que a associação teve muita pouca
atividade. Alguns, como Ângelo Correia e Marques Mendes, disseram mesmo que
não tinham qualquer recordação dela — e nenhum se referiu aos três projetos
financiados pelo FSE.
Passos Coelho disse ter participado na
preparação de duas outras acções, uma para Cabo Verde e outra para Angola, mas
afirmouue nenhuma delas se concretizou por falta de apoios. (…) Apesar da
escassa atividade de que há registo público, a associação ocupou desde 1996 e
pelo menos até 2001 um amplo escritório da Tecnoforma em Almada, pagando a
empresa uma remuneração regular a alguns dos seus dirigentes e pondo ao seu
serviço várias viaturas, nomeadamente um BMW e um Audi. Passos Coelho, ao que
consta, terá recebido durante três anos
cerca de 5.000 euros mensais.”
(http://www.publico.pt/portugal/noticia/passos-coelho-criou-ong-financiada-apenas-pela-tecnoforma-1575850)
Através desta instituição (CPPC),
pretendia-se obter financiamentos para projetos de formação profissional e
contava-se com a Tecnoforma para a operacionalização dos mesmos. Não houve,
aparentemente, na sua esfera de ação, objetivos de natureza científica,
nomeadamente, no âmbito da investigação tecnológica ou industrial, mas a
sociedade, em si, foi e é tão importante, como tudo o que ela é capaz de criar,
desenvolver ou explorar a partir de uma firme e séria aposta formativa no que
ela tem de melhor: os seus cidadãos.
Tendo em conta os resultados das missões e
ações desenvolvidas por esta instituição, fora e dentro do país, bem como a
proveniência dos fundos que desbaratou,
grande parte deles provenientes dos bolsos de todos os contribuintes, não
podemos deixar de apontar uma profunda falta de rigor, sensatez, transparência
e sentido de gestão aos seus responsáveis, ainda que nenhum perito nacional ou
internacional tenha sido convidado a pronunciar-se sobre o grau de competência,
seriedade e funcionamento desta ONGD.
Olha
se fosse hoje, hem! Será que alguém iria alimentar uma operação folclórica como
esta, que apenas serviu para encher os bolsos de alguns?!
Com tanto rigor, transparência e rigidez na
atribuição de financiamentos e com auditores internacionais à perna, o dr.
Passos Coelho e todos os que estavam ligados ao CPPC, sem grandes resultados
práticos obtidos nos seus projetos, missões e intervenções, e com um
desperdício de recursos visível a todos os níveis, exceto, naturalmente, para
quem usufruiu boas remunerações pelos serviços prestados (uns bons milhares de
euros mensais sob a forma de despesas de representação), iriam ter sérias
dificuldades em justificar tanto “crédito mal parado”. Certamente, ninguém se
chegaria a aborrecer minimamente com questões de “despesas de representação”,
tão somente, porque se esta instituição fosse previamente avaliada por qualquer
perito, não viria a receber um cêntimo pelos seus “projetos de intenções”.
Mas, mais vale tarde que nunca. Aplaudimos a
decisão do Senhor Primeiro Ministro. Afinal de contas, quem melhor do que ele
conhece a realidade do que são fundos mal aplicados e mal geridos?! A prova disso está bem patente
na determinação das suas palavras: “não há instituições que estejam acima da
avaliação e todas tem que ser avaliadas. (…) Precisamos das melhores garantias
[de] que o dinheiro que temos vai ser bem utilizado”.
“Não há sistemas infalíveis, mas é infalível
que o que não é devidamente auditado e avaliado, dá asneira pela certa”, diz
ainda Passos Coelho.
(http://www.publico.pt/politica/noticia/passos-volta-a-desafiar-ps-para-discutir-sustentabilidade-das-pensoes-antes-das-legislativas-1679386)
Quem poderá ter uma perceção mais
apurada da quantidade de instituições
(centros, observatórios e fundações) que para aí existem, criadas por outros
governos e, porventura, inadvertidamente, também pelo seu Governo, as quais
nunca foram avaliadas por ninguém…autênticos sorvedouros de dinheiros, sejam
eles provenientes de apoios públicos ou privados, sem nenhum proveito social
nem acréscimo para a cidadania ou para o país?!
Esperemos, então, que Passos Coelho estenda
esta medida de avaliação a toda e qualquer instituição favorecida por
financiamentos do Estado. É tempo de acabar com a mama a muita gente, em nome
da transparência, da sensatez e da seriedade governativas.
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