Lisboa
Diz-me muito
Diz-me pouco
Diz-me que o vento ao passar
Lhe sussurra nas janelas
Mensagens vindas do mar
Das rotas das caravelas
Parecem gritos de dor
Sons cortantes, compassados
De chicote e de tambor
Vêm de todos os lados
Lisboa
Diz-me muito
Diz-me pouco
Sobre os nossos marinheiros
Não sinto glória ou orgulho
Passavam meses inteiros
Comendo arroz com gorgulho
Diz-me grave, peremptória
Quero vestir-me de luto
Enquanto tiver na memória
Os fantasmas do escorbuto
Lisboa
Diz-me muito
Diz-me pouco
Diz-me que ganhou tesoiros
Com a venda da pimenta
Mas comeu ratos e coiros
E farinha pestilenta
Comeu passas do Algarve
Bebeu mijo e vinho azedo
Arrotou como um alarve
E embebedou-se de medo
Lisboa
Diz-me muito
Diz-me pouco
Sobre guerras e viagens
Não quer lembrar filhos seus
A esquartejar outros homens
Por esse mundo de Deus
Lisboa
Diz-me muito
Diz-me pouco
Diz-me que traz o olhar
Descontente e indeciso
Não sabe se há-de chorar
Ou ensaiar um sorriso
João Frada, Olhos nos Olhos da Alma, Edições CLINFONTUR
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