Jobs for the Boys
O Governo de Dilma Rousseff arrocha (oprime)
brasileiros, mas mantém 107 mil cargos comissionados (“jobs for the boys”)
integrados no governo não por concurso público, realização de provas
curriculares ou entrega de reconhecidos títulos académico ou profissionais,
comprovativos de conhecimento e habilidade específica para o exercício destes cargos, mas por livre decisão e nomeação político-partidária.
Este enorme “exército” de gente não chegou ao Governo
do Brasil, apenas, pela mão do Partido Trabalhista PT), ao qual Dilma Rousseff e
Lula da Silva, seu antecessor na Presidência da República, pertencem. Não. Apesar
da maior expressividade e responsabilidade do PT neste contexto, o contingente
estes 107 mil “jobs for the boys” são o resultado das nomeações realizadas por
todos os outros partidos que, sucessivamente, têm passado pela governação deste
país.
Com remunerações que oscilam entre 1 e 40 salários
mínimos nacionais, esta lista de “cargos comissionados” constitui uma tremenda
sobrecarga para os cofres de Estado. Para apoiar a Copa do Mundo e as Olimpíadas
realizadas no Brasil, muitas das comissões então criadas com objectivos
temporários, após os eventos, numa grande maioria, nunca viriam a extinguir-se,
passando a permanentes. Atualmente com outras funções, principescamente pagas
(recebendo salários que chegam a atingir
os 22 mil reais), tendo em conta a média de vencimentos recebidos pela normal
função pública brasileira e o baixíssimo ordenado mínimo nacional (788 reais,
correspondendo a cerca de 214 euros), há comissionados espalhados por todos os setores da administração pública, verdadeiras peças de xadrez ao serviço de interesses, eminentemente, político-partidários.
As remunerações dos “jobs” de comissionados que ocupam
cargos de direcção e assessoramento superior, ministerial ou outro, chegam a
atingir os 14,3 mil reais mensais, sem ter em conta outros benefícios e
subvenções.
Notícia de 05 de março de 2015
Por cá, pior ainda. Segundo um estudo efectuado por
Patrícia Silva, investigadora do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e
do Território da Universidade de Aveiro, o qual viria a constituir o material
da sua tese de doutoramento, defendida na mesma instituição, das “11 mil
nomeações celebradas em 15 anos pelos sucessivos e diferentes partidos” que
passaram pela governação portuguesa, entre 1995 e 2009, abrangendo os
executivos de Cavaco Silva, António Guterres, Durão Barroso, Santana Lopes e
José Sócrates, a maioria serviu apenas para “recompensar lealdades partidárias”.
Estas conclusões foram confirmadas por entrevistas realizadas,
por esta investigadora, a “51 dirigentes políticos, ministros e observadores
privilegiados da política portuguesa". (…) "Há um alinhamento
[notório de índole político], " entre os partidos que estão no governo e
as pessoas à frente" da administração pública do país.
Houve já quem tivesse tido um rasgo de sensatez e de moralidade
ético-política, pondo a hipótese de acabar com tantos “jobs for the boys”:
António Guterres. Tendo acabado de tomar posse como primeiro-ministro, em 1995,
manifestou nessa altura esta saudável e bem-vinda decisão político-administrativa.
Não passaria, porém, de uma boa intenção. Vinte anos depois, como nos afirma e
prova a ilustre investigadora da Universidade de Aveiro, as nomeações para
cargos públicos quer de direcção, quer de quadros técnicos, continuam a
verificar-se e a serem influenciadas pelos interesses, não do país, mas dos partidos
políticos…todos eles.
No seu estudo, a autora, depois de analisar e comparar
esta realidade a nível de diversos países, constatou que esta estratégia
viciosa de gestão político-administrativa, com sérias repercussões sobre o
erário público, face aos elevados salários ou remunerações pagos a tantos assessores,
jovens especialistas técnicos disto e daquilo, alguns deles acabados de sair dos
bancos das universidades, "não é exclusiva de Portugal". "Nos
casos de uma administração pública permanente, como no Reino Unido, os
ministros sentem-se desconfortáveis em trabalhar com essas administrações,
nomeiam “special advisors” e contornam estas limitações", diz-nos Patrícia
Silva.
Paulo Morais, vice-presidente da Transparência e
Integridade, Associação Cívica, sobre o mesmo assunto, afirma-nos que esta
realidade tem um "Impacto económico tremendo", nas contas do país.
"Só por milagre um boy de uma juventude
partidária, habituado a organizar jantares e comícios, consegue fazer um bom
trabalho num organismo público", critica Morais. O investigador reconhece
que "há milagres, mas a regra é que [os nomeados] tomem decisões
incompetentes e erradas".
O dirigente da TIAC admite que, no "círculo mais
restrito da execução de políticas, se recrutem pessoas de confiança [dos
governos], mas sempre com competência", sublinhando que "esse
critério da confiança faz sentido num universo de cem pessoas, não de cem
mil".
O governo atual, PSD/CDS, em 2012, através da criação
da Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (Cresap),
reaproveitando a ideia de Guterres, parece ter dado um passo em frente, ainda
que curto e inseguro, para a moralização definitiva deste problema, de modo a
que o recrutamento para cargos públicos possa vir a efectuar-se, não por cunhas,
simpatias ou influências político-partidárias, mas por mérito e competências
profissionais e curriculares. João Bilhim, presidente da Cresap, acredita que
esta mazela político-legislativa tem os dias contados. Mas, nem todos os
analistas compartilham desta visão optimista. Paulo de Morais afirma que ainda
é cedo para se fazer uma avaliação do novo paradigma, lembrando, todavia, que "em
teoria, é melhor que o anterior". "A questão é saber se vem romper
com o modelo anterior ou se o vai branquear."
(http://www.publico.pt/multimedia/video/estudo-prova-que-existem-mesmo-jobs-for-the-boys-201421217062)
Como última achega a esta análise, resolvemos comparar
os números de “jobs for the boys” que se apontam, quer para o Brasil, país com 202,7
milhões de habitantes (dados demográficos de 2014), quer para Portugal, com
cerca de 10,6 milhões de habitantes (2014).
Tendo em conta que no país irmão, como uma população
vinte vezes superior à nossa (isto é, mais de 200 milhões de habitantes), se
contabilizam 107.000 “nomeações políticas”, por cada 10 milhões de habitantes brasileiros
há cerca de 5 a 6.000 cargos públicos comissionados. Portugal, com uma
população de 10, 6 milhões de habitantes e 11.000 “cargos” de nomeação
política, apresenta uma taxa de “jobs for the boys” duas vezes superior à do
Brasil.
É perdularismo, governação insensata, grande complexidade
de gestão e administração pública dos recursos do país, mania das grandezas?!
Quais serão as razões que levam o Estado português e
os governos sucessivos a não alterarem este paradigma do desperdício e do esbanjamento,
continuando a legislar, a proteger e a perpetuar situações tão aberrantes como
esta, dos largos milhares de “jobs for the boys”, realidades profundamente gravosas
para os cofres públicos e para a economia nacional?!
Perguntamos,
porque é nosso dever interpelar quem nos governa, mas todos nós sabemos a
resposta.
Como
diria Eça de Queiroz, “mudam-se as moscas e a… [história] continua a ser a mesma…”.
Calendas Semânticas
João
Frada
Professor
Universitário (Ph.D.) da FML